terça-feira, 14 de abril de 2020

O REINO CONSPIRA


Adão de Souza Ribeiro

                        Tenho medo do poder. Não pelo que ele representa, mas, sim, pelo que ele esconde em suas entranhas. Ninguém escapa das garras daqueles que se sentem onipotentes, quando se assenhoram do poder. Por acharem que são donos da vida e da morte das pessoas, não se apiedam daqueles que estão à sua volta. Ou são seus vassalos, ou são seus inimigos. Para eles, não existem amigos, pois os únicos amigos que eles têm, são o dinheiro e os bajuladores.
                        Em nome de títulos e honrarias, perdem-se pelo caminho e deixam para trás, os princípios básicos da moral e dos bons costumes. Adoram bajuladores e pessoas que se deixam manipular em troca de míseros tostões. Ostentam joias, carros e propriedades, para que os menos afortunados veem neles, a figura de deuses imaculados. Essa corja não tem escrúpulos e, por isso, criam ao ser derredor, verdadeiros parasitas e pessoas submissas, prontas para atenderem os seus caprichos pessoais.
                        No início do reinado, todo são amigos. Sentam-se à mesa e degustam de tudo que são servidos pelas mucamas. Bebem vinhos e dão fartas gargalhadas, sem saber o porquê. Agradam a Rainha e aqueles que ladeiam o trono. Abraçam e se beijam, como se fossem irmãos de sangue. Depois do banquete, dançam valsas vienenses, no salão oficial ou deitam-se em redes, no jardim palaciano, feitos porcos de engorda. Essas são algumas prerrogativas e mordomias de que ocupa o poder.
                        Às vezes, com anuência ou conhecimento da Rainha, participam de uma sessão de orgia, regada com muito erotismo e fartas bebidas. No reino, tudo é permitido, desde que os vassalos e a plebe não tenham conhecimento. Que nada vaze para a imprensa, seja ela “marrom” ou não. Por acharem que tudo é eterno, acreditam que os deleites de tantas mordomias, se estenderão para sempre. Não se cuidam e tão pouco se preocupam com o futuro. Tenho medo do poder.
                        Aos poucos, nesse diapasão de embriaguez do poder, surgem uns mais famintos do que os outros. Então, sem que se percebam, alguns começam a mostrar suas garras e, os mais inocentes, não percebem isso. Lá na frente, por serem incautos, os mais inocentes, serão devorados impiedosamente, pelos espertalhões. Quem duvidar disso, leia: “A revolução dos bichos”, de George Orwell o, então, “O Príncipe”, de Nicolo Machiavelli.
                        É notório que, de uns tempos para cá, o Reino Caiçara foi infectado pelo vírus mortal da ganância descomunal de seus ocupantes. Implodiu desgraçadamente e nada sobrou dele, senão escombros e coisas distorcidas de um passado vergonhoso. Nada mais há que se fazer. Não há esperança que ainda possa se refazer das cinzas e, o que é pior, de cinzas fedorentas. Em meio às cinzas, está toda sorte de imoralidade.
                        É sabedor que nas entranhas do mundo palaciano, em meio aos vermes da ganância, criou-se um complô com o desejo velado de exterminar aqueles que não atendiam ou que atrapalhavam os interesses escusos dos bem aventurados da Corte. Primeiro, para eliminar os próprios pares e, depois, os que estavam além dos muros do Palácio Real. Não se sabe, se a Rainha tinha conhecimento ou não, desse exército de exterminadores, que agiam na calada da noite e sem conhecimento dos súditos desinformados.
                        Como na Santa Inquisição, saíram à caça de seus desafetos. Donos de tabloides e até o chefe da Guarda Real, estavam na lista dos condenados a dormirem para sempre na “mansão do amanhã”. Implantou-se o terror nas Províncias e, a partir de então, ninguém mais dormia em paz.  A Câmara dos Lordes e a Câmara dos Comuns, mostrando-se desatentas, nada faziam. Acreditando na impunidade, em razão da lentidão da Justiça, esse grupo de exterminadores tratava com escárnio a Suprema Corte.
                        Em que pese à morte anunciada do Reino, a Rainha continuava participando de viagens diplomáticas e de festas suntuosas, como se nada estivesse acontecendo debaixo dos seus olhos. Em razão de sua ignorância política e administrativa, não conseguia ver além do seu umbigo. Há um adágio popular, que diz: “Pior cego é aquele que não quer ver”. Um sábio ermitão do reino, já havia profetizado isso. Pena que não lhe deram ouvidos. É certo que os gênios vivem milhares de anos além do seu tempo, por isso, não se fazem entendidos.
                        Pelo andar da carruagem, não se sabe por onde caminha o destino do Reino Caiçara. Temo e não quero que isso seja uma profecia, que ele se descambe e caia num despenhadeiro sem fim. Lamento que os súditos, verdadeiro motivo da existência do Rino, sejam pessoas acéfalas, diante de tudo que ocorre. A ignorância de muitos, beneficia poucos. Diante de tudo isso, nada mais há que se fazer, senão esperar a derrocada final. Algo já previsto, mas que não se desejava jamais.
                        Before I say: “God save the Queen”, but now I say: “God save the Kingdon”. (Antes eu dizia: “Deus salve a Rainha”, mas agora eu digo: “Deus salve o Reino”).

Peruíbe SP, 14 de abril de 2020.


Um comentário:

Unknown disse...

Tudo se resume a: "O Poder Corrompe" e essa é a desgraça do meio.