domingo, 15 de dezembro de 2019

O QUINTAL


Adão de Souza Ribeiro

Na minha casa o quintal
Era diferente dos demais
Tinha jardim e até pardal
Tinha de tudo, muito mais.


Crianças para lá e para cá.
Brincadeiras o dia inteiro.
Éramos felizes a cantarolá
As coisas do cancioneiro.


Não tinha divisa e nem cerca.
Tinha-se liberdade para tudo.
Antes que a infância se perca,
Os sonhos pulavam o muro.


Enquanto a mãe no seu labor,
Feliz cuidava da lá nossa casa.
Entre os amigos havia o amor
Algo que em nós, não se acaba.


Os outros quintais eram gelados,
Com muros, portões e cimento.
Não tinham sonhos nem passado
Nem mesmo crianças lá dentro.

Peruíbe SP, 15 de dezembro de 2019.  

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

A ÁRVORE


Adão de Souza Ribeiro

A árvore lá do campo,
Entrelaça-se e se beija
Cobre com seu manto
Feito folha de madeixa.


Nas noites de tormenta,
Que assola a madrugada
Abraça amiga e acalenta
Pois a bonança não tarda.


Longevidade é quimera,
Que desenha com tempo
O tempo da longa espera
Louca bravura do vento.


A doce canção da chuva
Ao tocar seu corpo puro
Espanta toda a amargura
De um universo obscuro.


No seio da densa floresta
A árvore segue a sua sina
A natureza vive em festa,
Na graça daquela menina.

Peruíbe SP, 12 de dezembro de 2019.

domingo, 8 de dezembro de 2019

ANJOS DA DEZESSETE


Adão de Souza Ribeiro

                        Maurício nasceu numa pequena cidade, encravada no interior do Estado. E é naquele cenário bucólico, que se desenvolveu uma das mais belas histórias que se pode contar. Os sonhos dele e de um grupo de amigos, percorriam as ruas descalças, ora em aclive e ora em declive. Das árvores frondosas, todas enfileiradas pelas calçadas, colhiam-se os saborosos frutos da imaginação. Purificavam suas almas, banhando-se nas cachoeiras de águas cristalinas. Os amigos e amigas de sua idade compartilhavam com ele, a simplicidade da infância.
                        Não se via nas brincadeiras, que não tinham hora para começar, mas, sim, para terminar, qualquer tipo de querela. À noite, quando os amigos reuniam defronte sua casa, para o tradicional esconde-esconde, pega-pega, pula corda, amarelinha, passa anel, cobra-cega, pique-pique e outras tantas brincadeiras inocentes, lá estavam os pais de olho em tudo. Os genitores não abriam mão da responsabilidade e, por isso, as brincadeiras não dobravam a esquina. A liberdade tinha o alcance dos olhos.
                        Nas tradicionais festas religiosas, Maurício e sua turma vestiam-se de anjinhos, quer fossem nas missas domingueiras ou nas longas procissões, organizadas pelo padre octogenário. A pureza deles dava um tom de inocência e de santidade. Chamava atenção, o respeito e a obediência que tinham para com os pais e as pessoas mais velhas. Viam nas autoridades, o princípio da ordem pública, razão pela qual não desacatava, quando eram repreendidos. É certo que, ao serem criados com amor, no futuro tornar-se-iam pessoas probas.
                        Se fossem vistos após as dez da noite, perambulando sozinhos nas ruas, eram abordados e recolhidos numa Kombi, pelos Comissários de Menores. Só deixava o comissariado na presença dos pais, isso após os genitores assinarem termo de responsabilidade. Não se via, naquele tempo, crianças envolvidas em vícios ou praticando atos ilícitos. A Vara da Infância e da Juventude, era representada por uma varinha de marmelo ou margoso, que a mãe usava sem remorso. Não retrucavam as ordens dos pais e, para isso, bastava um olhar.
                        Lindas canções, com letras e melodias voltadas para a doçura da infância, povoavam a mente de Maurício de seus eternos companheiros. Fato é que ficaram marcadas para sempre em seus corações. Não havia nelas, apologia ao crime, incentivo à pornografia, desobediência à ordem pública e social, estimulo ao uso de drogas e por ai se vai. Na escola, imperava respeito aos educadores e não o enfrentamento violento que se vê nos tempos atuais. As crianças e adolescentes eram tratadas com tais e não como peças de manobra das políticas infames. Criança só queria ser criança.
                        Com o advento da televisão e, ultimamente, da internet, os tempos são outros. Estes dois veículos de comunicação, mudaram o comportamento da sociedade. Incutiu uma pseudo liberdade, em forma de libertinagem nas pessoas e, em especial, nos adolescentes e jovens. Hoje eles podem tudo. Acreditam que tem mil direitos e nenhum dever. Creem serem donos da verdade e, por isso, querem o mundo a seus pés. “Eles que mandam na casa e ninguém tira farinha”, diz o trecho de uma música sertaneja.
                        O que entristece e preocupa é que criaram leis absurdas, dando a eles a certeza de impunidade. Uma sociedade sem freio tende a cair no abismo do descontrole total. Cerca de quinhentos anos antes de Cristo, Pitágoras, pai do conceito de Justiça, norteadora do Direito, declarou: “Educai as crianças e não será preciso punir os homens”. Já as Sagradas Escrituras ensinam: “Instrui o menino no caminho que deve andar, e até quando envelhecer não se desviará dele” – Prov: 22:6. A disciplina é uma expressão do amor da parte dos pais: “Aquele que poupa a vara aborrece o seu filho; mas quem o ama, a seu tempo o castiga” – Prov: 13:24. E prossegue o ensinamento Divino, com relação aos filhos: “A vara e a repreensão dão sabedoria; mas a criança entregue a si mesma envergonha a sua mãe”.
                        Benditas foram às vezes, que o pai de Maurício e de seus amigos os corrigiram, quando cometiam alguns deslizes, mesmo que involuntários. Educaram a seus modos, sem se importarem com o que dizia a mídia insana e perversa. Entendiam que estavam preparando os filhos para o mundo dos que tinham o coração propenso ao amor. O estudo e o trabalho tomavam todo o tempo dos adolescentes e, por isso, não sobrava tempo para as maldades. “Mente ociosa é oficina do diabo”, diziam os mais velhos.  
                        Os anjos da infância de Maurício habitavam as igrejas, as missas  domingueiras, as longas procissões da padroeira e as orações contadas nos terços da avó. Eles espalhavam a bondade e o amor, pelas casas e ruas da pequena cidade, encravada no interior do Estado. Os anjos daquele tempo brincavam até às dez da noite, para, depois, dormirem o sono dos inocentes. É certo que jamais deixariam o conforto de seus lares, para baterem à porta do inferno, em busca de prazeres ilusórios.
                        Os anjos do passado, não desceriam do altar de suas santidades, para cometerem o pecado mortal, de abdicarem de suas inocências, como fizeram os “Anjos da Dezessete”.   

Peruíbe SP, 08 de dezembro de 2019.

quarta-feira, 27 de novembro de 2019

AS MULHERES DE ATENAS

Adão de Souza Ribeiro

                        Gosto de me reportar ao passado, não só pelo saudosismo incontrolável, mas, também, pelos ensinamentos memoráveis, que nos deixam para sempre. Não há quem, num momento da vida, não descansou por alguns instantes, o seu pensamento no outrora. Como numa película de cinema, lá estão às cenas inocentes da infância ou as reprimendas da escola do mundo. O presente, feito um espectador, está aqui ao nosso lado e o futuro é uma cortina a ser aberta. Mas o passado é um script, redigido quadro a quadro.
                        De vez em quando, ao rascunhar algum texto, coisa de quem se atreve a ser escritor, algo que não me ouso ser, abro o baú dessa cabeça de baiano e dano a mexer e remexer no passado. Viajo horas e horas, contemplando fragmentos de um tempo distante e que não volta mais. Sei que tem alguns assíduos leitores/sonhadores, os quais, também, viajam comigo nesta nave sem bússola, clepsidra ou ampulheta. Se eles são loucos como eu, então, deixa os loucos sonharem.
                        O tema é familiar, por isso, gosto de discorrer sobre o assunto. Ultimamente, ando enfadado com a enxurrada de informações, que chegam aos meus olhos e ouvidos, através do avanço tecnológico. Este turbilhão de conceitos e preconceitos, derramado no meu cérebro, em forma de notícias manipuladas, causam-me estresse e depressão. Recolho-me para dentro de mim, fecho a porta da minha intimidade pensativa e fico a “contar carneirinhos”, até a angústia passar.
                        O que pretendo dissertar no momento, o farei de uma forma arcaica. Não se espantem se, ao final, o tema transparecer rebuscado demais.  Tenho observado ao longo dos anos e com mais ênfase agora, que a mídia selvagem tem dado às mulheres um adjetivo, ao que me parece, mais superficial (comercial) do que de concreto (humano). Não pretendo aqui divergir ou criar polêmicas. Tenho medo da palavra, pois, uma vez solta, não se alcança nem mesmo a galope. Hoje a sociedade, arrastada pela mídia consumista, tem adjetivado o sexo feminino, como “mulheres empodeiradas”.
                        Na minha visão, mais caipira do que rudimentar, para serem empodeiradas, elas precisam estar na moda (usando roupas e sapatos de grife), bem como, quebrar todos dos princípios da moral e dos bons costumes. Precisam despudoradamente exibir o corpo como se fosse mercadoria exposta na prateleira da perdição. Não sou contra a sensualidade, mas, sim, a promiscuidade. Lá estão seminuas no rótulo de cerveja, no comercial de carro de luxo e nos maços de cigarro. Dá-se a conotação de que ao comprar um produto de luxo, leva uma mulher de brinde.
                        No tempo de minha mãe, avó e bisavó, as mulheres prezavam pelo comportamento recatado e compromissado com a família. Cuidar do lar e dos filhos era o objetivo maior. Enquanto o homem, feito leão, saia para conquistar a caça; a mulher, feito leoa, defendia de unhas e dentes, o ninho e os filhotes. Não percorriam além do portão da casa e, assim, marcavam território. Nada invadia a alcateia, como fazem hoje, as depravações do mundo moderno. As leoas do meu tempo respeitavam e amavam os seus machos. Não viam no respeito, sinônimo de submissão. Naquele tempo, não haviam cartilhas redigidas por formadoras de opinião, cuja moral deturpada contamina as fêmeas de hoje.
                        Quando o esposo partia para as batalhas sangrentas do dia a dia, isto é, para o árduo trabalho, em busca do alimento, ela o preparava com zelo e despedia-se com carinho. Ao cair do dia, quando cansado, batia à porta, o recebia com regozijo. Nada perguntava e nada cobrava, apenas o abraçava em sinal de gratidão. A esposa de hoje, parece querer devorá-lo, como se a batalha por ele vencida, não tivesse valor algum. Tempo moderno esse, que transformou a companheira do velho guerreiro, em inimiga mortal. A batalha que se trava hoje, não é no campo do inimigo, mas dentro do próprio lar. E nesta luta insana, não haverá vencedor e nem vencido.
                        Por isso, muitas vezes, temo em dissertar sobre temas antagônicos. Sei que muitos não compreenderão o meu ponto de vista. Mas como não sou dono da verdade absoluta, aceito críticas. Desde que respeitem o meu direito de livre expressão do pensamento, fiquem à vontade.  Desde o início dos tempos, a mulher foi criada para estar ao lado do marido, nem à frente e nem atrás. Portanto, foi concebida para ser a companheira e não inimiga. Foi desenhada para apoiar o homem na batalha e não para batalhar contra ele. Diz a Sagrada Escritura e não eu, um pobre mortal: “A mulher sábia edifica a sua casa, mas a insensata, com suas próprias mãos, a derriba”.  – Prov. 14:1
                        Não quero aqui, passar a errônea imagem de que sou um misógino enrustido, longe disso. Sou um discípulo e adorador do sexo feminino. Passo noites em branco, embriagando-me com as carícias femininas. Já viu um filho da terrinha negar fogo? Sobre minhas aventuras amorosas, que povoaram as minhas fantasias, já falei, quando escrevi sobre o amor platônico. Que saibam os leitores, que sou um defensor e amante dos desejos da carne. Mas o que me entristece e me deixa enraivecido é saber que o mundo moderno, transformou a fonte dos meus sonhos, numa inimiga mortal.
                        Ao discorrer sobre o comportamento das mulheres de outrora, a minha memória reporta às “Mulheres de Atenas”. Se a história criada em torno daquelas mulheres lendárias, não passou de conto, isso pouco importa. Para mim, o que interessa são os exemplos de respeito que nutriam pelos seus homens (maridos e guerreiros).
                        Um dia, quem sabe, as mulheres da minha Terra Pequena, mirar-se-ão naquelas Mulheres de Atenas.

Peruíbe SP, 27 de novembro de 2019.

domingo, 24 de novembro de 2019

BARQUINHO DE PAPEL


Adão de Souza Ribeiro

Um barquinho navega e flutua,
Nas ondas fortes e sem destino.
Querendo tocar a beleza da lua
E o velho sonho de um menino.

Não é uma vaidade e nem à toa
Que na leveza deste seu remar.
Nada leva da popa até sua proa
Apenas um bocado do sonhar.

Neste seu navegar mar à dentro
Encara a solidão e ondas bravias
Tuas velas, vela a vida e o vento,
Numa luta bravia, noites e dias.

Lá longe, na linha do horizonte,
Vê-se o barco desenhar sua rota.
No mar que um dia já foi ontem,
Viver navegando, é o que gosta.

Naquele frágil barquinho de papel
Que tanto ama e ninguém entende
Vai em paz com ele, tocar o céu
Ou atracar feliz, noutro continente.
 Peruíbe SP, 24 de novembro de 2019.

sábado, 16 de novembro de 2019

VIDA EFÊMERA

Adão de Souza Ribeiro


A vida é feita de momentos.
O tempo urge, corre e voa.
É invisível, como os ventos,
Não tem alma, não perdoa.

É preciso viver cada instante
Como se fosse o único beijo.
Da doce e atraente amante,
A abandonar, ainda no leito.

A vida rude jamais te espera,
Corre enquanto ainda respira.
Ela é um sonho, uma quimera.
Se passou, não sonha, já era.

As rugas indeléveis no corpo,
São marcas daquele passado.
Renove, e recomece de novo.
O teu coração respira, amado.

Se tão repentina, a tua amada,
De um jeito covarde e cruel.
Dos teus braços, ela foi levada,
Logo, será devolvida, lá o céu!

Peruíbe SP, 16 de novembro de 2019.

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

AMORES DISPERSOS


Adão de Souza Ribeiro


Conta-me um segredo:
Onde estão os amores,
Que tempos não vejo.
Se vejo, causam dores?


Tão longe e dispersos,
Em páginas já viradas.
Prisioneiros de versos
Em estrofes inacabadas.


Puros, meigos e infantis,
Que povoam sonhos meus
E eu não sei o que eu fiz.
Para sofrer assim, Deus!


É uma tortura sem fim,
Amar a quem te ignora
Não foge assim de mim
Volta logo, amor, agora.


Peruíbe SP, 13 de novembro de 2019.

sexta-feira, 8 de novembro de 2019

GUAIMBÊ, AMOR ETERNO!


Adão de Souza Ribeiro


Vestida com pureza,
Verde dos cafezais.
Tu és nossa princesa
De sonhos celestiais.

A linda praça matriz
No silêncio da rua.
Faz o seu povo feliz,
Que a paz ele cultua.

Esse teu povo pujante
E tão ordeiro também.
Leva teu nome adiante.
Louvado seja. Amém!

Contigo nossa infância ,
De ternura recheada.
È a eterna lembrança.
Brincadeira na calçada.

O teu ventre bendito,
Que gera esse carinho.
Tem seu nome escrito,
Em nosso coraçãozinho

Tu tens mil encantos
E hoje eu sei o porquê.
Deste amor sacrossanto
Oh, amada Guaimbê!

Peruíbe SP, 08 de novembro de 2019.

sexta-feira, 1 de novembro de 2019

FALAR DE AMOR


Adão de Souza Ribeiro

Quero falar de amor,
Mas não tenho jeito.
De pensar, sinto dor,
Que aperta o peito.

Quero sentir alegria,
Na imagem da amada.
Nesta noite tão fria,
Sem beijo, sem nada.

Quero tocar a solidão,
Do amor de verdade.
Buscar naquele portão,
O amor da tenra idade.

Quero riscar um verso
Desenhar a sua graça
O sonho ninar no berço
É certo que tudo passa.

Quero olhar a beleza
Recordar em silêncio
O sorriso da princesa
Enquanto é tempo.
Peruíbe SP, 01 de novembro de 2019.

domingo, 27 de outubro de 2019

AMOR DE PERDIÇÃO


Adão de Souza Ribeiro


Maria ama José
E ele ama Maria.
Tanto amor e fé,
Que até arrepia.


Amor gera filhos
Vida linda aquela
Tudo nos trilhos,
Paz feita, em tela.


Ele maltratou esposa
E o amor pereceu
Dele ela se enoja.
Tristeza meu Deus!


Nesse jogo de intriga,
Maria jogada à traça
Desejou uma amiga.
Vinho de outra taça.


Algo eu não entendo:
Se ela casa na igreja
Se vive no convento
Padre, louvado seja!


José, amigo, e agora?
Amor fugiu de medo
Felicidade se revigora
Vê se muda o enredo.


Peruíbe SP, 27 de outubro de 2019.



sábado, 26 de outubro de 2019

AS MADEIXAS DE MADALENA


Adão de Souza Ribeiro

As madeixas de Madalena
Tinham elas, encantos mil.
Era assim, um lindo poema,
Escrito com amor, fio a fio.


Madalena esbanjava graças,
Com seus belos seios fartos.
Eu sei, eram atraentes taças,
Não são histórias, são fatos.


Ela tinha o dom da sedução,
Com aquele manso gingado.
Foi assim que meu coração,
Sem querer, por ela, fisgado.


Madalena, por onde tu andas?
Em que coração, habita agora?
Amada, as saudades são tantas,
De tristeza minha alma chora.


Madalena, tua linda madeixa,
Bailando suave à distância,
Assim sem querer me deixa
Eterna lembrança da infância.

Peruíbe SP, 26 de outubro de 2019.

domingo, 20 de outubro de 2019

O PATO E A LAGOA


Adão de Souza Ribeiro

Um pato na lagoa,
Assim feito criança;
Brinca, ria à toa,
E nunca se cansa.

Naquele doce bailar,
A alma leve flutua.
Parece o verbo amar,
Querendo beijar a lua.

Ser feliz nada custa.
Vida nada se espera.
Para que tanta luta,
Se tudo é quimera?

A paz de presente.
O rio de felicidade.
Ainda tem gente,
Trocando pela cidade.

Na lagoa o pato
Feliz perde a hora
Então fez um pacto:
O tempo é agora.

Mauá SP, 20 de outubro de 2019.

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

PÉ NA ESTRADA

Adão de Souza Ribeiro

                                   Cristóvão era um homem tenaz e arrojado. Ainda envolto nas fraldas, deixou uma pequena cidade baiana, localizada no alto do rio São Francisco. E feito retirante, partiu rumo à outra cidade encrustada na noroeste do Estado mais rico da União. Ali nos braços de seus pais, cravou morada e marcou território. Por oito décadas, escreveu em letras góticas, a história mais linda que se viu. Escreveu e assinou, deixando sua marca registrada.
                                    Passou a infância e a juventude, entre a escola e a lavoura. Ganhou dos pais, o gosto pelo trabalho e, também, o comportamento rude, em razão da vida rude. De pouca conversa, mas de honestidade impar, ensinou aos seus rebentos, o caminho a ser percorrido, em busca da sobrevivência. No auge da juventude, ao participar da festa junina, numa cidade próxima, enamorou-se por uma jovem, para depois, desposar-se dela.
                                   O jovem casal, por força do destino, deu continuidade à história, gerando filhos, sete no total. Certo é que a pacata cidade foi, aos poucos, moldando o destino de Cristóvão. No estudo não passou da quarta série primária, mas a sapiência adquirida nasceu da luta cotidiana, escrita no quadro negro da vida. Ele amava o lugarejo e o povo o admirava e respeitava. Ao longo dos anos, a vida ganhava forma diferente, a cidade crescia e Cristóvão seguia o destino de ser cidadão e genitor.
                                   Um belo dia, a vida presenteou-o com uma encantadora surpresa e o destino beijou-lhe suavemente o rosto. As mãos calejadas pelo cabo do guatambu passaram a conduzir o seu sonho rumo ao amanhã. Antes caminhava a pé, até o bairro Bondade, carregando nas costas, as ferramentas para lida na lavoura de café, além do “imborná”, com o sustento para o almoço. Daquele dia em diante, as mãos que desde a infância, foram forjadas para o trabalho, passaram a tocar o volante de um caminhão. A lavoura, plantada e capinada por ele e transportada no lombo do burro, agora usaria a carroceria do Mercedes Benz, para ser entregue em outros rincões, além daquela pequena cidade.
                                   E assim, Cristóvão trocou a estrada de chão batido, com pontes de madeira e cerca de arame farpado, nas laterais, pela estrada de asfalto, com viadutos e placas de sinalizações em suas laterais. Naquela longa estrada da vida, enfrentou o dia e a noite, chuva e sol, calor e frio. E, ainda, os perigos em cada curva e parada, a fim de abastecer o veiculo ou para o repouso de um corpo cansado de tanta luta. Tinha compromissos a serem honrados e família para sustentar. Não podia esmorecer. Era um homem rude, para com uma vida tão rude.
                                   Para os fedelhos, sete no total, era rotina ver o pai sair com o caminhão carregado de mercadoria, ora para serem entregues no entreposto de alimentos em São Paulo SP, ora para o porto marítimo de Santos SP. Quando o caminhão convergia à esquerda, adentrando a Rua Almirante Barroso, com destino a rodovia, tudo era mistério, pois, pelo risco da estrada, não sabia se voltaria. E quando o pai regressava tudo era festa, tudo era paz. Sabia o primogênito dos irmãos, que a dedicação e o amor de Cristóvão, custaram-lhe a juventude e que, por conta da responsabilidade, não viu os filhos crescerem. Quantas vezes tomou conhecimento do nascimento de um dos herdeiros, estando ainda na estrada.
                                   Por conta de longas horas, enfurnado na boleia do caminhão, contraiu problemas de saúde que acabaram afetando o coração, articulação, visão, pulmão e tantas outras coisas. O corpo era uma máquina, assim como o caminhão, precisava de descanso ou recompor a energia. Mas tinha compromissos a serem honrados e família para sustentar. Não podia esmorecer. Naquelas idas e vindas, o tempo passou e passou o tempo. A carga da idade começou a pesar nas costas daquele homem tenaz e arrojado. Os pés já não mais caminhavam com o mesmo ritmo, pelas longas estradas da vida.
                                   O tempo feito um caminhão desenfreado, levou a família a destinos inesperados. Cresceram, estudaram, mudaram, casaram e formaram novas famílias. Mas ficou gravado na retina, o caminhão saindo carregado de mercadoria e seu Cristóvão ao volante, acenando para os filhos, até sumir no horizonte. E os filhos, por suas vezes, esperançosos de deitarem no colo do pai, em busca de afago, quando ele voltasse daquela longa e cansativa viagem.
                                   Mas um belo dia, seu Cristóvão fincou o pé na estrada, para uma viagem derradeira e nunca mais voltou. O ronco do motor, o piscar dos faróis, a canção da buzina, como era de costume, marcou para sempre, na memória de todos da família. Do seu rosto alegre, partindo para aquela viagem derradeira, antes do combinado, restou apenas saudade.

Peruíbe SP, 18 de outubro de 2019.

quarta-feira, 9 de outubro de 2019

O PONTO


Adão de Souza Ribeiro

                        Quando estou taciturno, saio por aí, caminhando a esmo. Ao perambular sem pressa, pelas províncias do “Reino Caiçara”, contemplo tudo o que se descortina à volta, hipnotizado pelas cenas cotidianas. Nada escapa à retina dos meus olhos e nem às lembranças tardias, daquilo que a memória gravou sobre lugares e pessoas. Divago por longo tempo e, assim, distancio-me das preocupações rotineiras e das decepções, que tanto afligem a alma e o coração.
                        As províncias e as capitanias hereditárias do reino são ricas em tudo. Ricas na sua fauna e flora, assim como, na biodiversidade costeira. Um mar exuberante, com lugares paradisíacos e propícios ao romantismo, se bem que isso está em desuso. Um povo receptivo e, em razão do clima praiano, não tem pressa para nada. O Sol escaldante, o vai e vem das ondas, bebida fermentada ou destilada, água de coco gelada, um petisco oriundo do mar e a doce imagem de uma ninfeta desfilando na areia encantam os olhos de todos os seres viventes.
                        Mas ele, o reino, também tem lá suas mazelas. Basta distanciar-se para o interior das províncias longínquas dos olhos do Palácio Real, para notar-se o que há de mais triste, no que diz respeito ao abandono do bem público e aos súditos desvalidos. Quem por lá transita, com olhos de observador, tem a impressão que se caminha por outro mundo, um lugar abandonado por alguém, que jurou ser fiel às necessidades intrínsecas do ser humano. Matos ao redor dos casebres, dejetos escorrendo a céu aberto, buracos ao longo do caminho, ruas ermas e sem iluminação, falta de transporte e por ai se vai.
                        Enquanto isso, a Família Real, a Corte e seus bajuladores, os Ministros, os membros da Câmara dos Lordes e da Câmara dos Comuns e, ainda, da Suprema Corte, vão muito bem, obrigado. Os que governam se locupletam do luxo e da mordomia, enquanto que a plebe vive num misere de dar pena. E o que é pior, o povo sofrido se contenta com as migalhas recebidas e agradecem os seus exploradores, como se aqueles, estivem fazendo favores. Cada povo tem o rei (governante) que merece.  Fico indignado, revolto-me, pois não sou um boi de canga.
                        Nas minhas andanças, como um retirante nordestino, faço minhas paradas para o descanso do corpo, já carcomido pelo tempo. Então, ali no meu descanso repentino, deleito-me a conversar com as pessoas simples. Delas ouço todo tipo de lamento. Enquanto o povo sofrido vive de migalhas, a burra da Família Real e dos nobres da Corte está empantufada de moedas de ouro. E o povo? Ah, o povo! O povo é apenas uma massa de manobra.
                        Quando o Rei Fabrício, ascendeu ao trono, após a queda de sua antecessora, a rainha insana e incompetente, ele prometeu um Governo sério e transparente. Quando, ao ser coroado por sua Santidade, o Papa Raimundo I, jurou fidelidade ao povo e erradicação da miséria. Disse que seus governados deveriam esquecer o passado e que transformaria o novo reino, num paraíso. No entanto, não disse a quem pertenceria o novo paraíso.
                        Reportando às minhas andanças, onde sempre exerci o eterno dom de observador, pude separar o joio do trigo. Notei que havia um muro imaginário, o qual dividia o mundo, estando de um lado, o real e, do outro, o utópico.  Mas são nas coisas e nas atitudes simples, que podemos avaliar a competência e a honestidades de nossos governantes. Ao passar defronte uma parada de ônibus, onde embarcava os passageiros, notei que estava quebrada e bambeando das pernas. Tal parada (ponto, como era popularmente conhecida), ficava próxima ao hospital, onde a plebe era atendida e não a realeza. Batava um mirrado vento de noroeste, para destruí-la por completo.
                        Creio que vossa majestade, o Rei Fabrício, ao desfilar com a carruagem real, escoltada pelos cavaleiros oficiais e, ainda, rodeado de seus asseclas e bajuladores, não notaria a existência de uma das marcas registradas de seu desleixo para com o patrimônio público e, muito menos, pelo desrespeito ao povo que o venera.
                        Mas, estava certo de que, um dia, encontraria o Soberano vagando sozinho pelas cercanias do Palácio Real. Então, estando ele longe de seus vassalos e asseclas aproximar-me-ia dele e faria algumas observações ao seu desgoverno. Dentre tantas coisas e, em especial, à mencionada parada de ônibus, por mim observada, com toda deferência diria, cochichando aos seus ouvidos, a fim de não constrangê-lo:
                        Majestade, a que ponto nós chegamos!”

Peruíbe SP, 09 de outubro de 2019.

domingo, 29 de setembro de 2019

ÁLBUM AMARELADO


Adão de Souza Ribeiro

                                   De repente, nada mais que de repente... o passado descortina-se à nossa frente. Por mais que queiramos ser futuristas, o ontem nos persegue impiedosamente. Marcando nossa vida, deixa sinais indeléveis, como o ferrete cravado na hipoderme dos animais. Depois de marcados para sempre, não há como esconder nossa origem, história e DNA. A cidade natal e os lugares por onde passamos, é apenas o habitat natural, onde vamos desenvolver nosso enredo. Por isso, temos que nos cuidar para redigir o que há de melhor no nosso interior.
                                   Mas e o futuro, o que dizer dele? Não passa de uma incógnita e uma quimera. Por isso, nossa língua é riquíssima ao descrever o seu tempo verbal, isto é, passado, presente e futuro. E Deus, antes mesmo da nossa língua existir e de balbuciarmos as primeiras palavras, criou as fases da vida, ou seja, infância, adolescência, juventude, adulta e velhice. Quer queira e quer não, somos forjados a entender, que para tudo no tempo, tem seu tempo. E assim há de ser até o fim dos tempos.
                                   Num dia desses, quando vaga o tempo e descansa a vida um pouco, resolvi fuçar no baú empoeirado da minha história, onde o passado e o presente se se cruzam e se misturam. De vez em quando, num momento de nostalgia, somos levados a desterrar lembranças adormecidas e empoeiradas pelo esquecimento. Dentre tantas quinquilharias, carcomidas pelos longos anos de abandono, deparei-me com um velho álbum de família. A ausência de ventilação e umidade desfigurou sua capa e, por pouco, não apagou as imagens de registros importantes.
                                   Aos poucos e ad cautelam, passei a manusear suas folhas, onde se encontravam uma infinidade de fotos, com os mais variados tamanhos e cores. Quem me visse ali, introvertido naquela lida, notaria mudanças bruscas do meu semblante, Ora alegre, ora surpreso e, por vezes, ora pesaroso, por tentar compreender o que fez a mão pesada do tempo. Ver que as pessoas do parentesco ou da amizade transformarem-se ao longo da vida, custando-me muito a identificá-las, era por demais, entediante.
                                   Com pesar, pude observar que muitos já partiram para a mansão do amanhã e que outros, na sua maioria, após ganharem forma adulta, seguiram por caminhos longínquos e para onde não sei. Cada foto, que apanhava e observava com maior esmero, transportava-me a um momento de doce lembrança.  Todas elas tinham uma razão de ser. E para ser sincero, ressuscitaram passagens maravilhosas, registradas na longa estrada da vida. Além dos rostos nelas contidos, também haviam registros de  ruas, praças, casas e comércios, destruídos pela modernidade e pela falta de respeito ao patrimônio histórico.
                                   Em que pese à tecnologia de hoje, com modernos aparelhos, os quais captam imagens com tamanha precisão, posso afirmar isso sem sombra de dúvida, que aquelas dos tempos de outrora, tinham uma magia indescritível. A fotografia em preto e branco sussurrava aos ouvidos e mostrava aos olhos de quem a contemplava, que o tempo passou e eternizou o que sempre foi belo. Prova disso, era a ternura e a simplicidade de que quem, voluntária ou involuntariamente, pousava para a câmera. Como sou um saudosista irrecuperável, não pude conter as lágrimas, presas no coração dilacerado pelos anos que se passaram.
                                   Na minha terra natal, havia um único retratista (assim era conhecido) oficial para todos os eventos, sagrado ou profano, o qual fora responsável por boa parte do meu acervo. Ele era um japonês, que amava a arte de registrar, através das lentes de uma máquina pré-histórica, todos os momentos inesquecíveis do povo. Os casamentos, batizados, aniversários, festas populares e religiosas, jogos futebolísticos, comícios políticos e até velório, não fugiam das incansáveis lentes, daquele filho do “sol nascente”. Bastava o freguês chamar o japonês e lá estava ele. De olho no lance, não perdia um flash.
                                   Cada momento precioso de nossas vidas, registrado em fotos coloridas ou não, representa a eternização de um passado vivo em nossas memórias. Através delas, os nossos herdeiros conhecerão a história viva da família, da qual pertencem e que, por isso, deverão amá-la e respeitá-la. Também aprenderão a admirar e respeitar o seu torrão natal, onde nasceu e por onde passaram seus ancestrais.
                                   Por onde andam as pessoas do meu tempo, não sei. Sei apenas que ainda estão ali, ao alcance das minhas mãos. Num relance, ao admirar por longos e prazerosos momentos, aquelas relíquias, guardadas no fundo do baú, senti-me “de volta ao passado”. Só aquele álbum amarelado e carcomido pelo tempo, foi capaz de tamanha magia.

Peruíbe SP, 29 de setembro de 2019.

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

O ROUXINOL E EU


Adão de Souza Ribeiro

                          Todas as manhãs, antes mesmo do nascer do sol, eu era carinhosamente acordado com o cantarolar melódico de um lindo rouxinol. Cantar junto à janela do quarto, tornou-se uma rotina daquela ave de plumagem exuberante. Se durante a noite, o sono fora conturbado, fruto de grande estresse diurno, a cantoria hipnotizava o pensamento fatigante. Naquelas cenas matutinas, ao pousar no batente da janela de madeira, fitava-me deitado no colchão de palha, como que dizendo: “Acorda, menino, vem saudar a natureza comigo!”.  
                                   Um dia, com a permissão da natureza que o concebeu, passei a chamá-lo de “Miudinho” e ele, humildemente entendeu que não se tratava de apelido pejorativo. Por tamanho amor que nutria por ele, ofertava-o um banquete de frutas cítricas, cuidadosamente colocadas no peitoril da janela. Ali da cama preguiçosa, contemplava-o no seu alimentar e no seu bailar de felicidade. De onde vinha tamanha disposição de acordar tão cedo e aquele imenso prazer de cantarolar para mim?
                                   De repente, quando menos esperava, fugia de mim. Batia suas asas para lugar incerto, como que querendo brincar de esconde-esconde. E eu fazia de conta que não me importava com sua ausência. Não demorava e ouvia seu cantar entre os galhos de um frondoso pé de ipê. Tentava divisá-lo, sobre os galhos, por entre as flores, mas era em vão. “Miudinho” sabia disfarçar e a camuflagem de seu corpo pequenino se misturava com a beleza das flores daquela arvore imponente.
                                   Não sei o porquê, mas havia uma eterna cumplicidade entre nós. Era bonito de ser ver nossa amizade tão sincera. Quando no seu dom de voar, ele partia para sua lida diurna, em busca de aventuras distantes, eu ficava preso ao limite do meu corpo. Como ser pensante, eu corria para lá e para cá, a fim de cumprir minha missão e obrigação de viver e sobreviver. Minuto a minuto, lutava para vencer as procelas da vida. Enquanto eu obedecia à lei da gravidade, o meu amigo “Miudinho” desafiava todas as leis impostas pela natureza. Voar era a prova de que ele não tinha limites.
                                   O dia parecia ter uma eternidade de horas, longe do querido amigo “Miudinho”. Quando a noite chegava, abria-se uma cratera profunda no meu coração, diante do silêncio e da ausência daquele pássaro cantante. Nos meus momentos de solidão, debruçava na janela e, diante da escuridão, contemplava o firmamento. Lá distante, a lua olhava dentro dos meus olhos e via o meu pesar que, de tão pesaroso, era só lágrima e só choro. Por onde andava o meu querido rouxinol?
                                   O vento, de vez em quando, ao passar por entre as folhas de árvores centenárias, balbuciava algo inteligível, como que querendo dar notícias do “Miudinho”. A mente, por sua vez, pensando em abreviar meu sofrimento, aconselhava-me a colocá-lo numa gaiola, pois, assim, não fugiria mais de mim. De imediato, reprovei a sugestão. Nossa amizade sincera, não permitia isso. Até porque, o alegre rouxinol nasceu para ser livre. Quem ama não prende, não magoa, não escraviza, não se apossa. A alma de quem ama é leve, por isso, não prende, mas liberta.
                                   Cansado da ausência de “Miudinho”, meu rouxinol querido, eu era vencido pelo sono profundo. Durante a noite, perdido em sono profundo e sonhos confusos, eu ficava imaginando como vencer todos os questionamentos de uma vida tão efêmera e tão passageira. Queria ter um corpo pequenino e asas enormes, que pudessem conduzir-me para bem longe dos meus devaneios e das decepções do cotidiano. Meu amigo, de alma tão pura, não sofria dessas mazelas. Eu tinha imaginação e ele tinha asas.
                                   Mas o que confortava o meu espírito, era saber que logo pela manhã, antes mesmo do nascer do sol, lá estava ele, batendo na minha janela e, mais uma vez, convidando-me para saudar a natureza. A esperança de que haveria mais um lindo dia a ser contemplado, chamava-se “Miudinho”. Lembro-me saudosamente do meu pai, quando, em forma de ensinamento dizia: “Meu filho, acorda! Pássaro que não deve nada a ninguém há muito tempo já está acordado”. Acho que o Rouxinol, meu amigo querido, ouvia meu pai dizer aquilo, e, por isso, vinha me acordar primeiro.
                                   Quis o destino que, um dia, pela manhã, antes mesmo do nascer do sol, esperei pelo amigo “Miudinho” e ele não veio. Penso que ele se perdeu em namoricos com uma fêmea de sua espécie. Assim ficou menos dolorido, aceitar a sua ausência para sempre. Tanto ele, como meu pai, foram embora para nunca mais, sem, ao menos avisar-me. Todos os dias, pela manhã, antes mesmo do nascer do sol, deixo a janela do meu quarto, aberta. No peitoril um banquete de frutas cítricas. De repente, quem sabe, ele e meu pai aparecem felizes na janela, dizendo: “Acorda menino, vem saudar a natureza comigo!”. Isso chama-se esperança.

Peruíbe SP, 28 de setembro de 2019.