Adão
de Souza Ribeiro
“Penso,
logo existo.” – René Descartes.
Desde muito cedo, isto é, da tenra infância,
Fabrício se diferenciava dos demais de sua época. Ele era pobre, desprovido de
beleza física e introvertido, por isso, passou despercebido, durante o tempo
que viveu na sagrada Terrinha. Gostava de brincar e de fazer peraltice, como
toda criança e, para isso, tinha muita criatividade. Pelas suas atitudes, sem
querer ou perceber, demonstrava ser muito inteligente.
Nos intervalos das viagens pelo seu mundo
infantil, costumava ler tudo que vinha às suas mãos. Fabrício era um curioso
nato e tinha sede de saber. Para ele, o que impulsionava e mudava o mundo, eram
as perguntas e não as respostas. A sua mente vivia carregada de por quês.
O menino gostava de dividir suas descobertas com os coleguinhas de traquinagens.
Por isso, era visível vê-lo rodeado de crianças sentadas a seu lado, prestando
atenção as suas histórias sérias ou hilariantes.
Muitas vezes, os professores se espantavam
com perguntas ou comentários de Fabrício, sobre assuntos incomuns para idade. O
menino não entendia o fato de pessoas aceitarem com passividade, determinadas
imposições da sociedade sobre os menos esclarecidos. Para ele, aquilo torturava
a alma e aviltava os preceitos da vida. Talvez fosse por isso, que ele se
afundava em leituras de cientistas e filósofos renomados.
Ele
tinha uma paixão doentia por Aristóteles, Platão, René Descartes, Thomas
Hobbes, Arthur Shopenhauer, Friedrich Wilhelm Nietzchice, Ludvig Wittgenstein, Fredrich
Hegel, Immanuel Kant, Sócrates, K’ung Chung-ni (Confúcio), Charles-Louis de
Secondat (Montesquieu), Carl Gustav Jung e por aí se vai. Vê-se que o menino
era um autodidata.
Quanto mais estudava em busca de conhecimento,
mais se embriagava na leitura e parafraseava Sócrates, dizendo: “Só
sei que não sei”. Uma das grandes características de Fabrício, era ser
desprovido de vaidade. Não gostava de ostentar roupas espalhafatosas e era
comedido na alimentação. Não fazia distinção das pessoas e tratava todos de meus queridos amigos. Em razão da sua
empatia, vivia angariando amizade e simpatia dos amiguinhos, fossem eles
abastados ou não.
O que mais se podia admirar no menino
prodígio, nascido na santa Terrinha, era sua preocupação com o progresso desenfreado,
arrastado por um futuro incerto. Aquilo era notório nas suas escritas. Por
isso, era gritante quando ele deixava transparecer o seu apego ao saudosismo.
Até parecia que o passado lhe proporcionava um grande conforto, isto é,
acalentava a alma e o coração. Havia quem gostava ou não, daquilo que ele
falava ou escrevia.
O menino falava e escrevia muito bem. Ele
adorava dissertar sobre suas ideias, fossem elas bem digeridas ou não pelos
leitores. “Depois de publicada, ela não mais lhe pertencia e, sim, ao mundo”,
pensava ele. Os elogios ou críticas, eram inevitáveis. Fabrício tinha um desejo
incontrolável em escrever e, para ele, aquilo era um vício. Era como beber
água, pois, matava a sede.
Certa feita, ao deparar com a crítica maldosa
de um leitor, não se abateu. Pelo contrário, lembrou-se da célebre frase do
filósofo Carl Gustav Jung: “Pensar é difícil. Por isso a maioria das
pessoas prefere julgar”.
Um dia, quis o destino,
que Fabrício, assim como os demais coleguinhas de infância, partisse em busca
de novos mundos. Ao vagar por lugares desconhecidos, viu que não foi em vão,
aquilo que aprendeu durante a convivência simples e suas incansáveis leituras.
O mundo disse: “Vai ser alguém na vida. Um fazer de justiça ou um contador de causos,
talvez!”.
Bendita a santa Terrinha
que gerou aquele menino!
Saudades dele.
Peruíbe SP, 31 de
março de 2024.