Dom Orlando, era
uma pessoa carismática e de uma cultura impar. Por isso, ao longo dos anos,
conquistou uma imensidão de admiradores e seguidores, em virtude do o que ele
falava ou fazia. Isso custou à perda de privacidade e atrapalhava sobremaneira
os seus momentos de clausura, que a vida episcopal exigia. Quantas vezes, ele
era chamado de madrugada, para o ritual de extrema unção ou para apaziguar
desavenças conjugais. Também para festanças, regadas a vinhos e carne de
primeira, com aquela gordurinha provocante.
O seu jeito bonachão, físico acima
do peso, traços germânicos, sorriso espontâneo, além, é claro, do comportamento
gozador (sarrista), colocava-o no topo das pessoas benquistas, no lugarejo.
Creio que a batina caíra bem. O coração
propenso ao bem e o espirito alegre, eram pré-requisitos pra transformá-lo no
apascentador de ovelhas. Era a primeira pessoa a ser lembrada, para convites em
festas particulares e festividades públicas.
Nas horas vagas, dentro dos muros
do seminário, Dom Orlando gostava de lidar com plantas ornamentais e
hortaliças. Devorava livros sobre botânica e, também, sobre a fauna. Por
diversas vezes os amigos de celibato, surpreendia-o conversando demoradamente
com as plantas. “Bom dia, meu pé de
alface”, “Por que anda triste minha
begônia?”, “Como é linda a sua roupa,
minha rosa”. Achava lindo as abelhas e os beija-flores, na dança incansável
pela busca do pólen.
Aos poucos, o povo do lugarejo
descobriu que, além do dom divino de cuidar da fé, também tinha uma queda para
o curandeirismo. De vez em quando, longe do altar sagrado da igreja matriz, ele
receitava uns remédios caseiros, indicando o uso de plantas medicinais. Não
bastasse isso, ensinava algumas simpatias, como por exemplo, para espantar mal
olhado (olho gordo), quebranto, asma, “trabalho feito”, etecetera e tal. Que o
bispo emérito, seu superior hierárquico, não soubesse disso, pois podia
excomunga-lo.
Mas há uma história, não
comprovada, de que em virtude destes dons extra paróquia, Dom Orlando teria
sido convidado por Vossa Santidade, a fim de visita-lo no Palácio Apostólico,
residência oficial do líder da igreja. Havia rumores de que o Papa estava
acometido de uma doença não divulgada pelo clero. Chegou aos ouvidos do supremo
líder, que Dom Orlando curava tudo E, para isso, usava até métodos não
ortodoxos, isto é, não reconhecidos pela Santa Sé. Até hoje, não se sabe se
isso é real, mas lenda é lenda, convenhamos.
Mas o que aconteceu no lugarejo e
aos nossos olhos, podemos narrar, sem medo de cometermos uma heresia. Vamos ao
causo (história). De um jeito discreto, Dom Orlando dava lá suas escapadelas. Durante
uma partida de baralho, ele percebeu que um dos participantes demonstrava
dificuldade para sentar-se. Ao perceber que se tratava de hemorroidas, Dom
Orlando orientou que o enfermo fizesse banho de assento com urtiga, não a
folha, mas sim a casca. Por acreditar nos dons religiosos, medicinais e
curandeiros do vigário, lá se foi o incomodado para o banho.
Narram as línguas malévolas, que o
enfermo, depois da infusão na região afetada, fora socorrido às pressas para o
nosocômio (hospital) da cidade mais próxima. Lá permaneceu por cerca de quinze
dias, onde, a todo o momento, lembrava-se de Dom Orlando, não mais com simpatia, mas
com tristeza, pelo estrago retal, que o conselho medicinal lhe proporcionara. A
receita pode não ter proporcionada a cura esperada, mas é certo que Dom Orlando
perdeu um parceiro das horas de lazer e um devoto fervoroso.
Mas as histórias pitorescas de Dom
Orlando, o pároco do lugarejo, não param por aí. Contam que, em razão do seu
amor pelas plantas e por saber dos poderes que delas emanam isso somado às fortíssimas rezas, Dom Orlando passou a fazer uso da urtiga para benzer pessoas
e fazer simpatias. Mas o que chamou atenção dos fiéis e, principalmente das
beatas, foi o fato de que ele passou a exorcizar demônios das pessoas, cujos corpos
que ardiam em pecado.
Foi por isso que, no jardim que
circunda a igreja, um artista renomado, construiu o busto de um homem e, do
lado dele, a folha da SANTA URTIGA. Credo em cruz!