Dizem que a língua portuguesa
é a mais complexa, porém, a mais precisa, quando procura decifrar o significado
exato de algo. Conjugar os verbos no tempo correto, definir o que é sujeito e o
que é do predicado, dizer se é oxítona, paroxítona ou proparoxítona e os
advérbios é, sobremaneira, muito difícil. Outras línguas, podem soar bonitas aos nossos ouvidos, mas a
nossa tem um sabor diferente. Os nossos lábios se deleitam ao pronunciarem palavras
rebuscadas, arcaicas ou chulas.
Desde a tenra idade, tenho feito da palavra, a
minha ferramenta de trabalho e de prazer. Há uma cumplicidade entre ela e eu,
coisa de autoflagelação, uma simbiose inexplicável. Vou ao orgasmo, quando
redijo uma poesia ou uma crônica. Viajo no mundo das letras, como se eu
estivesse comandando uma nave interplanetária. Só eu sei o bom e quão suave é
ser brasileiro e ter a língua portuguesa, como a língua pátria.
Um dia desses, passei a observar com carinho a
minha esposa e, em especial, quando ela pronuncia algumas palavras em meio a
frases simples e desprovidas de vaidade. Uma palavra sem sentido e,
descontraidamente, colocada no meio de uma frase, tem um sabor inigualável. Não
só pela palavra em si, mas pela forma como minha esposa a pronuncia. Dá uma
vontade louca de comer aquela palavra catchup e mostarda.
Os olhos dela brilham, quando os lábios balbuciam
a palavra “óbvio”. O rosto se contrai de felicidade e há uma metamorfose
silenciosa por todo o seu corpo. Não sei se ela já procurou no dicionário, o
significado daquela palavra tão pequena e tão doce. Penso que não deve matar
tal curiosidade, pois, ao saber, perderá a graça, o encanto, o sabor. A
inocência de quem a pronuncia é que transforma aquela palavra num tesouro de
valor impar.
Foi com o jeito simples da minha esposa, que
aprendi o valor imenso que a palavra exerce sobre nossa vida... nosso
cotidiano. A nossa língua não é só para degustar o alimento ou para oscular a
face, mas, acima de tudo, para expressar o sentido exato daquilo que pensamos
ou sentimos. Foi com minha esposa, que aprendi que o obvio não é apenas o que
está claro, evidente, que salta aos olhos; mas, sim, aquilo que enche a boca ao
ser pronunciado por ela.
Aprendi, isso sim, que a amo demais e que é óbvio
que salta aos nossos olhos (meu e dela) que nascemos um para o outro. O que não
traduz esse nosso sentimento é óbvio que não consta do nosso coração e nem no
dicionário do “Aurélio”.
O óbvio pelo óbvio, deixa como está.
Peruíbe SP, 21 de novembro
de 2013