domingo, 15 de dezembro de 2019

O QUINTAL


Adão de Souza Ribeiro

Na minha casa o quintal
Era diferente dos demais
Tinha jardim e até pardal
Tinha de tudo, muito mais.


Crianças para lá e para cá.
Brincadeiras o dia inteiro.
Éramos felizes a cantarolá
As coisas do cancioneiro.


Não tinha divisa e nem cerca.
Tinha-se liberdade para tudo.
Antes que a infância se perca,
Os sonhos pulavam o muro.


Enquanto a mãe no seu labor,
Feliz cuidava da lá nossa casa.
Entre os amigos havia o amor
Algo que em nós, não se acaba.


Os outros quintais eram gelados,
Com muros, portões e cimento.
Não tinham sonhos nem passado
Nem mesmo crianças lá dentro.

Peruíbe SP, 15 de dezembro de 2019.  

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

A ÁRVORE


Adão de Souza Ribeiro

A árvore lá do campo,
Entrelaça-se e se beija
Cobre com seu manto
Feito folha de madeixa.


Nas noites de tormenta,
Que assola a madrugada
Abraça amiga e acalenta
Pois a bonança não tarda.


Longevidade é quimera,
Que desenha com tempo
O tempo da longa espera
Louca bravura do vento.


A doce canção da chuva
Ao tocar seu corpo puro
Espanta toda a amargura
De um universo obscuro.


No seio da densa floresta
A árvore segue a sua sina
A natureza vive em festa,
Na graça daquela menina.

Peruíbe SP, 12 de dezembro de 2019.

domingo, 8 de dezembro de 2019

ANJOS DA DEZESSETE


Adão de Souza Ribeiro

                        Maurício nasceu numa pequena cidade, encravada no interior do Estado. E é naquele cenário bucólico, que se desenvolveu uma das mais belas histórias que se pode contar. Os sonhos dele e de um grupo de amigos, percorriam as ruas descalças, ora em aclive e ora em declive. Das árvores frondosas, todas enfileiradas pelas calçadas, colhiam-se os saborosos frutos da imaginação. Purificavam suas almas, banhando-se nas cachoeiras de águas cristalinas. Os amigos e amigas de sua idade compartilhavam com ele, a simplicidade da infância.
                        Não se via nas brincadeiras, que não tinham hora para começar, mas, sim, para terminar, qualquer tipo de querela. À noite, quando os amigos reuniam defronte sua casa, para o tradicional esconde-esconde, pega-pega, pula corda, amarelinha, passa anel, cobra-cega, pique-pique e outras tantas brincadeiras inocentes, lá estavam os pais de olho em tudo. Os genitores não abriam mão da responsabilidade e, por isso, as brincadeiras não dobravam a esquina. A liberdade tinha o alcance dos olhos.
                        Nas tradicionais festas religiosas, Maurício e sua turma vestiam-se de anjinhos, quer fossem nas missas domingueiras ou nas longas procissões, organizadas pelo padre octogenário. A pureza deles dava um tom de inocência e de santidade. Chamava atenção, o respeito e a obediência que tinham para com os pais e as pessoas mais velhas. Viam nas autoridades, o princípio da ordem pública, razão pela qual não desacatava, quando eram repreendidos. É certo que, ao serem criados com amor, no futuro tornar-se-iam pessoas probas.
                        Se fossem vistos após as dez da noite, perambulando sozinhos nas ruas, eram abordados e recolhidos numa Kombi, pelos Comissários de Menores. Só deixava o comissariado na presença dos pais, isso após os genitores assinarem termo de responsabilidade. Não se via, naquele tempo, crianças envolvidas em vícios ou praticando atos ilícitos. A Vara da Infância e da Juventude, era representada por uma varinha de marmelo ou margoso, que a mãe usava sem remorso. Não retrucavam as ordens dos pais e, para isso, bastava um olhar.
                        Lindas canções, com letras e melodias voltadas para a doçura da infância, povoavam a mente de Maurício de seus eternos companheiros. Fato é que ficaram marcadas para sempre em seus corações. Não havia nelas, apologia ao crime, incentivo à pornografia, desobediência à ordem pública e social, estimulo ao uso de drogas e por ai se vai. Na escola, imperava respeito aos educadores e não o enfrentamento violento que se vê nos tempos atuais. As crianças e adolescentes eram tratadas com tais e não como peças de manobra das políticas infames. Criança só queria ser criança.
                        Com o advento da televisão e, ultimamente, da internet, os tempos são outros. Estes dois veículos de comunicação, mudaram o comportamento da sociedade. Incutiu uma pseudo liberdade, em forma de libertinagem nas pessoas e, em especial, nos adolescentes e jovens. Hoje eles podem tudo. Acreditam que tem mil direitos e nenhum dever. Creem serem donos da verdade e, por isso, querem o mundo a seus pés. “Eles que mandam na casa e ninguém tira farinha”, diz o trecho de uma música sertaneja.
                        O que entristece e preocupa é que criaram leis absurdas, dando a eles a certeza de impunidade. Uma sociedade sem freio tende a cair no abismo do descontrole total. Cerca de quinhentos anos antes de Cristo, Pitágoras, pai do conceito de Justiça, norteadora do Direito, declarou: “Educai as crianças e não será preciso punir os homens”. Já as Sagradas Escrituras ensinam: “Instrui o menino no caminho que deve andar, e até quando envelhecer não se desviará dele” – Prov: 22:6. A disciplina é uma expressão do amor da parte dos pais: “Aquele que poupa a vara aborrece o seu filho; mas quem o ama, a seu tempo o castiga” – Prov: 13:24. E prossegue o ensinamento Divino, com relação aos filhos: “A vara e a repreensão dão sabedoria; mas a criança entregue a si mesma envergonha a sua mãe”.
                        Benditas foram às vezes, que o pai de Maurício e de seus amigos os corrigiram, quando cometiam alguns deslizes, mesmo que involuntários. Educaram a seus modos, sem se importarem com o que dizia a mídia insana e perversa. Entendiam que estavam preparando os filhos para o mundo dos que tinham o coração propenso ao amor. O estudo e o trabalho tomavam todo o tempo dos adolescentes e, por isso, não sobrava tempo para as maldades. “Mente ociosa é oficina do diabo”, diziam os mais velhos.  
                        Os anjos da infância de Maurício habitavam as igrejas, as missas  domingueiras, as longas procissões da padroeira e as orações contadas nos terços da avó. Eles espalhavam a bondade e o amor, pelas casas e ruas da pequena cidade, encravada no interior do Estado. Os anjos daquele tempo brincavam até às dez da noite, para, depois, dormirem o sono dos inocentes. É certo que jamais deixariam o conforto de seus lares, para baterem à porta do inferno, em busca de prazeres ilusórios.
                        Os anjos do passado, não desceriam do altar de suas santidades, para cometerem o pecado mortal, de abdicarem de suas inocências, como fizeram os “Anjos da Dezessete”.   

Peruíbe SP, 08 de dezembro de 2019.