Adão de Souza
Ribeiro
Maurício nasceu numa pequena cidade,
encravada no interior do Estado. E é naquele cenário bucólico, que se
desenvolveu uma das mais belas histórias que se pode contar. Os sonhos dele e
de um grupo de amigos, percorriam as ruas descalças, ora em aclive e ora em
declive. Das árvores frondosas, todas enfileiradas pelas calçadas, colhiam-se
os saborosos frutos da imaginação. Purificavam suas almas, banhando-se nas
cachoeiras de águas cristalinas. Os amigos e amigas de sua idade compartilhavam
com ele, a simplicidade da infância.
Não se via nas brincadeiras, que não tinham
hora para começar, mas, sim, para terminar, qualquer tipo de querela. À noite,
quando os amigos reuniam defronte sua casa, para o tradicional esconde-esconde,
pega-pega, pula corda, amarelinha, passa anel, cobra-cega, pique-pique e outras
tantas brincadeiras inocentes, lá estavam os pais de olho em tudo. Os genitores
não abriam mão da responsabilidade e, por isso, as brincadeiras não dobravam a
esquina. A liberdade tinha o alcance dos olhos.
Nas tradicionais festas religiosas, Maurício
e sua turma vestiam-se de anjinhos, quer fossem nas missas domingueiras ou nas
longas procissões, organizadas pelo padre octogenário. A pureza deles dava um
tom de inocência e de santidade. Chamava atenção, o respeito e a obediência que
tinham para com os pais e as pessoas mais velhas. Viam nas autoridades, o
princípio da ordem pública, razão pela qual não desacatava, quando eram
repreendidos. É certo que, ao serem criados com amor, no futuro tornar-se-iam
pessoas probas.
Se fossem vistos após as dez da noite,
perambulando sozinhos nas ruas, eram abordados e recolhidos numa Kombi, pelos
Comissários de Menores. Só deixava o comissariado na presença dos pais, isso
após os genitores assinarem termo de responsabilidade. Não se via, naquele
tempo, crianças envolvidas em vícios ou praticando atos ilícitos. A Vara da
Infância e da Juventude, era representada por uma varinha de marmelo ou margoso,
que a mãe usava sem remorso. Não retrucavam as ordens dos pais e, para isso,
bastava um olhar.
Lindas canções, com letras e melodias
voltadas para a doçura da infância, povoavam a mente de Maurício de seus
eternos companheiros. Fato é que ficaram marcadas para sempre em seus corações.
Não havia nelas, apologia ao crime, incentivo à pornografia, desobediência à
ordem pública e social, estimulo ao uso de drogas e por ai se vai. Na escola,
imperava respeito aos educadores e não o enfrentamento violento que se vê nos
tempos atuais. As crianças e adolescentes eram tratadas com tais e não como peças
de manobra das políticas infames. Criança só queria ser criança.
Com o advento da televisão e, ultimamente, da
internet, os tempos são outros. Estes dois veículos de comunicação, mudaram o
comportamento da sociedade. Incutiu uma pseudo liberdade, em forma de
libertinagem nas pessoas e, em especial, nos adolescentes e jovens. Hoje eles
podem tudo. Acreditam que tem mil direitos e nenhum dever. Creem serem donos da
verdade e, por isso, querem o mundo a seus pés. “Eles que mandam na casa e ninguém
tira farinha”, diz o trecho de uma música sertaneja.
O que entristece e preocupa é que criaram
leis absurdas, dando a eles a certeza de impunidade. Uma sociedade sem freio
tende a cair no abismo do descontrole total. Cerca de quinhentos anos antes de
Cristo, Pitágoras, pai do conceito de Justiça, norteadora do Direito, declarou:
“Educai
as crianças e não será preciso punir os homens”. Já as Sagradas
Escrituras ensinam: “Instrui o menino no caminho que deve andar,
e até quando envelhecer não se desviará dele” – Prov: 22:6. A
disciplina é uma expressão do amor da parte dos pais: “Aquele que poupa a vara aborrece
o seu filho; mas quem o ama, a seu tempo o castiga” – Prov: 13:24. E
prossegue o ensinamento Divino, com relação aos filhos: “A vara e a repreensão dão
sabedoria; mas a criança entregue a si mesma envergonha a sua mãe”.
Benditas foram às vezes, que o pai de
Maurício e de seus amigos os corrigiram, quando cometiam alguns deslizes, mesmo
que involuntários. Educaram a seus modos, sem se importarem com o que dizia a
mídia insana e perversa. Entendiam que estavam preparando os filhos para o
mundo dos que tinham o coração propenso ao amor. O estudo e o trabalho tomavam
todo o tempo dos adolescentes e, por isso, não sobrava tempo para as maldades. “Mente
ociosa é oficina do diabo”, diziam os mais velhos.
Os anjos da infância de Maurício habitavam as
igrejas, as missas domingueiras, as
longas procissões da padroeira e as orações contadas nos terços da avó. Eles
espalhavam a bondade e o amor, pelas casas e ruas da pequena cidade, encravada
no interior do Estado. Os anjos daquele tempo brincavam até às dez da noite,
para, depois, dormirem o sono dos inocentes. É certo que jamais deixariam o
conforto de seus lares, para baterem à porta do inferno, em busca de prazeres
ilusórios.
Os anjos do passado, não desceriam do altar
de suas santidades, para cometerem o pecado mortal, de abdicarem de suas
inocências, como fizeram os “Anjos da Dezessete”.
Peruíbe SP, 08
de dezembro de 2019.