segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

LEÃO INDOMÁVEL

 

Adão de Souza Ribeiro

O leão aqui dentro de mim

Vive numa luta bem feroz.

Louca, desigual e sem fim,

Que só ouve a minha voz.

 

Nesta floresta tão urbana,

Aonde vai, leão não sabe.

Da vida, na guerra insana.

Sei que acontece é grave.

 

Nas idas para lá e para cá

E vencer o desconhecido.

Sou leão da tribo de Judá

Desde meus tempos idos.

 

Vou à caça e não caçado,

E sou fadado ao sucesso.

A fauna, rei mais amado.

E lembrado neste verso.

 

Sou leão, indomável fera.

Se todos respeitam a juba

É que na longínqua terra

De Deus, tive santa ajuda!

Peruíbe SP, 25 de janeiro de 2021.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

SONHOS INFANTIS

 

Adão de Souza Ribeiro

 

Quando no silêncio da madrugada

Eu tão saudoso, vir sonhar contigo.

Cuida bem de mim, não diga nada.

Por favor, abraça e dá o teu abrigo.

 

Não deixa que o pesadelo acorde,

Das minhas fantasias de infância.

E no sonho, eu sou um rico lorde,

Que vive o belo amor à distância.

 

Aqueça-me sempre com o corpo,

Beija este meu rosto com carinho.

Sussurra mil palavras de conforto

E diga que eu não estou sozinho.

 

Não tenho culpa de te amar demais

Eu padeço deste pecado, meu bem.

Pois só Deus conhece os meus ais.

Por eu te amar tanto, que mal tem?

 

Não caçoa do meu sonho, mulher.

Anos a fio, eu vivo só desta ilusão,

De desejar aquilo que não queres.

Quem consegue mudar o coração?

 

Peruíbe SP, 22 de janeiro de 2021.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

CONFISSÃO

 

Adão de Souza Ribeiro

Padre, o coração quem manda,

No sentimento, queira ou não.

Amei todas: Maria e Amanda

E preciso fazer uma confissão.

 

Aqui no santo confessionário,

De ti peço humilde clemência.

Penso que eu não fui salafrário

Por isso aceito toda penitência.

 

Amai a todos como a ti mesmo

Vi lá bem na Sagrada Escritura

Confesso, ó padre, este segredo.

Sem pensar, cometi tal loucura.

 

De quantos perdões eu preciso?

Confesso diante da alva batina,

 Carne é fraca, também o juízo.

Meus olhos já desejam Cristina.

 

Se não fosse a sua fé sacerdotal

De renúncia à mulher e ao sexo,

Diria com a alma e a força total:

Eu te perdoo, você está certo!

 

            Peruíbe SP, 15 de janeiro de 2021.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

LOUCO ROMÂNTICO

 

Adão de Souza Ribeiro

 

Por correr muito atrás de ti.

Perdi a noção, fiquei manco.

Não sabe o quanto eu sofri,

Por amar demais, fui tonto.

 

Por te desejar sem medida

Esqueci de cuidar de mim.

Onde guardei minha vida,

Com o aroma de jasmim?

 

Por ser o eterno escravo

Não me livrei desta cela.

Somos um casal: Cravo,

Não vive sem a Canela.

 

Por ser louco romântico,

Dias de hoje, a coisa rara.

Corro fascinado e atônito

Eu fico cego, perco a fala!

 

Peruíbe, 11 de janeiro de 2021.

 

domingo, 10 de janeiro de 2021

FORA DE MODA

 Adão de Souza Ribeiro

 

Se te amar é fora de moda,

Como me diz o desalmado.

Diga-me o que só consola,

Quem sonha ali a teu lado?

 

Do passado vive quem ama,

Eu sei. O futuro é tão incerto

Fantasia é uma forte chama,

Que eterna arde a céu aberto.

 

Se ama de um jeito moderno,

Tresloucado, assim sem rumo.

Deixa-me sonhar com o eterno

Pois sou Júpiter e ela é a Juno.

 

Não venha dar-me conselho.

De uma paixão nada entende.

Sem experiência é só fedelho

Amor é divino.  É rio fluente.

Peruíbe SP, 10 de janeiro de 2021.

 

 

sábado, 9 de janeiro de 2021

ALCAIDE, CABRA BOM

 

Adão de Souza Ribeiro

                               A governança de um município exige sabedoria, discernimento e pulso firme.  Um alcaide borra-botas ou Maria vai com as outras, não serve. A história universal sempre reservou um canto para os governantes mal preparados para o cargo. Caem no ostracismo e na Grécia antiga, eram condenados ao desterro, com uma pena de dez anos, numa votação secreta outorgada pelo povo.   

                        As disputas políticas, na minha terra natal, eram acirradas. Até pareciam final de decisão de campeonato futebolístico. Nas vendas, botecos e na praça matriz, os bate-bocas estendiam-se até altas horas da noite. De um lado, os apoiadores; do outro, os opositores. De vez em quando havia troca de empurrões ou tapas, entre os mais exaltados. Muros pintados, bandeirinhas, santinhos e jingle dos candidatos, alegravam o lugarejo. Eu, ainda menino, nada entendia de disputa eleitoral. Por isso, só apreciava aquele furdunço. “A política passa e as pessoas permanecem”, pensava comigo.                                                                                                                                             

                        Naquele ano foi eleito Setembrino de Souza, com maioria esmagadora dos votos. Sua plataforma foi defender os interesses daquele povo desvalido. Corrupção não existia no dicionário e nem na linguagem simplória dos capiaus. Uma vez empossado, passou a cumprir o prometido. Em pouco tempo, colocou em ordem no caixa da Prefeitura Municipal. Não aceitava conchavo político, pois, para ele, o bem público estava acima dos interesses pessoais e particulares.

                        Setembrino de Souza era um homem arrojado. Vindo das bandas do Norte do País, em cima de um pau-de-arara, trazido nos braços dos pais, ainda enrolado nos cueiros, encontrou acolhimento ali. Essa era a razão maior de seu amor pela terra acolhedora. Todas as manhãs, com o sol despontando no horizonte, saia para vistoriar a cidade, montado no “Chá Preto”, um jumento caolho e manco de uma perna. Travestido de vaqueiro, sem esquecer-se do cachimbo, abastecido com fumo-de-corda, realizava sua romaria cotidiana.

                        Com um jeito simples no falar e firme nas decisões, logo conquistou a simpatia de todos os subordinados e cidadãos. Como passatempo, gostava de ouvir e fazer fofocas e, ainda, bisbilhotar a vida alheia. O rosto sisudo, característica do nordestino, impunha medo e respeito. No gabinete, procurava atender a todos, sem distinção. Não era à toa, que recebia todo tipo de agrado, desde galinha caipira, sacos de mandioca, pedaços de pamonha, feitas por dona Joana e por ai se vai. Só não aceitava propina em razão do cargo.

                        Os recursos financeiros vinham dos impostos prediais, do comércio e da agricultura. Por isso, assim como os municípios vizinhos, tinha que, de penico na mão, bater á porta dos Governos Estadual e Federal, clamar por verbas, a fim de saldar suas promessas de campanha. “Tenho que honrar meu bigode”, dizia ele constrangido. O povo não podia sentir-se enganado. Missão dada é missão cumpria.

                        Certa feita, acompanhado de assessores diretos, bateu á porta do Governador. O chefe do Estado recebeu todos os prefeitos com suntuoso almoço. Uma iguaria diversificada. Política sabe como é! Muito tímido, pouco escolado e de palavras diretas, o nosso alcaide sentiu-se um peixe fora d’água naquele banquete palaciano.  Pratos e talheres de inox, taças de cristais, guardanapos delicadamente dobrados, a decoração da mesa, as luzes em tom solene, os serviçais uniformizados, os convivas comportados ao redor da mesa, tudo aquilo assustou o representante supremo da nossa terrinha.

                        Num determinado momento e a certa altura do jantar, sentindo-se incomodado com tanto luxo, Setembrino de Souza, Sua Excelência, o nosso Alcaide, alegando estar sem apetite, manifestou desejo de se retirar. Lá na terrinha não tinha aquela frescura toda. Comia-se cuscuz amassado com as mãos, tomava-se vinho no copo americano e limpava-se a boca com a barra da toalha. Até cumprir todo aquele ritual palaciano, a fome já fora embora. Já fazia horas, que o estômago de Setembrino de Souza roncara, anunciando a chegada da fome.

                        Os assessores diretos tentaram contornar a situação. Os convidados só deixam o local, depois do Governador, o anfitrião. Homem empirriado e de opinião, não abdicava do desejo de se retirar. Seria uma afronta a todos e em especial, ao chefe do Estado, tamanha descortesia. Aquilo chegou aos ouvidos do Governador, que sentava à cabeceira da mesa.

                        Então polidamente o Governador, dirigindo-se ao Setembrino de Souza disse: “Setembrino, honrado Prefeito, é demasiadamente prazeroso tê-lo entre nós. Fique e coma conosco”.

                        Diante de tanta insistência e não acostumado com os verbetes grã-finos, que o momento proporcionava, Setembrino de Souza – nosso Alcaide, respondeu educadamente e com toda simplicidade que lhe era peculiar: “Então me dá um pedaço do CONOSCO”.

                        Até hoje não se sabe, se ele pediu um pedaço do CONOSCO com katchup ou mostarda. Sabe-se apenas que o banquete palaciano entrou para a história da nossa amada terrinha. Tudo isso por causa do Setembrino de Souza, nosso Alcaide.

                        Deus salve nosso Alcaide, cabra bom!

 

Peruíbe, 09 de janeiro de 2021.

terça-feira, 5 de janeiro de 2021

SHAKESPEARE, MEU CONTERRÂNEO

 

Adão de Souza Ribeiro

 

                        Outro dia, depois de apreciar a obra “Romeu e Julieta”, num momento de lucidez, pensei com meus botões: “Shakespeare é meu conterrâneo e viveu a infância na minha terra natal”.  O nome do casal, protagonista do romance, era um codinome para não comprometer os personagens reais, que transitaram entre nós. Não pairava dúvida que se tratava de Marivaldo e Mytiko, sendo ela moradora na mesma rua que eu. Já Marivaldo, foi meu colega de classe na escola primária.

                        Vou narrar o que sucedeu com o casal, de minha infância interiorana, para que se compreenda que Shakespeare inspirou-se na história deles para criar seu romance épico, conhecido mundialmente e que se tornou um marco na literatura universal. Só quem viveu na terrinha conheceu o amor impossível entre Marivaldo e Mytiko. Portanto, conclui-se que William Shakespeare, nasceu na terrinha, a noroeste do Estado.

                        Lenda ou não, contavam nossos anciões que, durante a Segunda Guerra Mundial, os japoneses diziam: “Se o Japão ganhar a guerra, os brasileiros irão puxar carroça”. Certo é que Hiroshima e Nagasaki sepultaram aquele sonho. No entanto, os descendentes da terra do Sol Nascente traziam no peito aquele orgulho nipônico.

                        Quis o destino, que a vida de Marivaldo e Mytiko se cruzasse. Ainda nos corredores da escola primária, passaram a enamorar. A princípio, com troca de olhares e, depois, com discretas carícias. Mas cidade pequena sabe como é: nada fica escondido debaixo do lençol. Não demorou muito para que até os cachorros vira-latas soubessem daquele amor estonteante. Era bonito de se ver o jeito que trocavam olhares e carícias. Um verdadeiro roteiro, para um filme líder de bilheteria. Todos torciam por um “happy ending (final feliz)”.

                        Mas um dia, uma fofoqueira de plantão levou ao conhecimento do pai de Mytiko, que a filha andava bolinando com Marivaldo. Tal notícia macabra feriu de morte a honra de Hosokawa Hashimoto, pai Mytiko. Envergonhado, pensou em haraquiri (suicídio). “Como pode o giri no musuko (genro) puxar carroça?”, pensou entristecido o chichi (pai). Depois de abdicar do haraquiri, jurou a musume (filha) de morte. Acidade ficou dividida. De um lado, a colônia nipônica apoiava a família “Hashimoto”; do outro, os amigos de infância apoiavam a família “da Silva”, berço de Marivaldo da Silva. Também tinha a turma do deixa disso.

                        De boca em boca, o assunto virou manchete. Honra manchada, lava-se com sangue. O amor sincero escondeu-se da tirania de velhos conceitos e preconceitos. As pressões só fortaleciam o sentimento dos pombinhos apaixonados. Com passar do tempo, as ameaças acentuadas e o desespero tomaram conta do casal. Perder o grande amor jamais! Tomar uma decisão drástica, eis á solução. A cidade vivia a expectativa de um final feliz para história dantesca. Se Janete Clair fosse viva e soubesse do amor do casal, rabiscaria uma novela líder de audiência, no horário das vinte e uma.

                        Em data que não me recordo, a cidade acordou triste com o buchicho de que Marivaldo e Mytiko fugiram, para o fim do mundo, tomando rumo, que ninguém sabia. A fofoqueira de plantão sentiu remorso, mas já era tarde. Hosokawa não se entristeceu. Melhor perder a Mytiko do que quebrar uma tradição milenar, vinda das bandas do Oriente. Já para a família “da Silva”, terminara um pesadelo. Afinal de contas, para eles, a felicidade mora no coração de quem ama a pessoa desejada e não na autoridade de quem imagina ser dono dos nossos sentimentos.

                        Guilherme Valadares, vulgo William Shakespeare, nasceu e cresceu comigo ali, na Rua Rui Barbosa, em Guaimbê SP, minha terra natal, na Noroeste do Estado. Portanto, vivenciou comigo tudo que vi e vivi na infância. Ele também teve um amor platônico, bem sei. Dizem os historiadores, que ele era oriundo de Stratford-upon-Avon, interior da Inglaterra. Lorota, apenas lorota. Só não é lorota a história de Marivaldo e Mytiko, na qual “Gui”, meu conterrâneo, se inspirou para escrever “Romeu e Julieta”.

                        The End (O Fim).

 

Peruíbe SP, 04 de janeiro de 2021.

 

sábado, 2 de janeiro de 2021

VIDA CAMPESINA

 

Adão de Souza Ribeiro

O gado solto lá no pasto,

Longe do mundo nefasto.

O lago de água cristalina,

Coisa da vida campesina.

 

A casa de sapê no morro,

Triste e pedindo socorro.

Pé de ipê beija natureza,

Encanto, ó bendito seja!

 

O fogão à lenha da vovó,

Passado. É a saudade só.

Longe se vai entre dedos

Tigela com seu torresmo.

 

A estrada de chão batido

Campo, tudo faz sentido.

Cabocla de trança e chita,

A vida pura e tão bonita.

 

Um som suave na vitrola

A antiga música de viola.

Mãe rezando a ladainha,

Irmã faz arte na cozinha.

 

Cachaça depois da labuta,

O eco no fundo da gruta.

No rio, um peixe no anzol;

Na terra, rastro do caracol.

 

Quintal, garbosa galinha.

E a paz daquela tardinha,

Ao som alegre do canário

Não há mais belo cenário!

 

Só quem viveu no campo

Sabe o porquê dói tanto.

Dá um aperto no coração,

Lembrar-se do velho sertão.

Peruíbe SP, 02 de janeiro de 2021.