Adão de Souza
Ribeiro
Pitiulica, cujo nome de batismo era Osvaldo,
não tinha mais do que doze anos de idade. Lembro-me dele, como se fosse hoje:
magro, cabelos cacheados e esvoaçados, trajando camisa e short surrados,
combinando com um par-de-chinelo, na mesma situação. Pitiulica tinha por
costume, dentre outras manias, fazer coleção de qualquer coisa. O seu passatempo
era colecionar figurinhas, marcas de maço-de-cigarro, tampas de bebida e por ai
se vai.
Que fique registrado, que não era só ele que
tinha aquela mania. Outros tantos moleques, inclusive eu padecíamos do mesmo
costume. Não era por acaso, que erámos vistos perambulando pelos logradouros do
vilarejo, em busca de tais objetos que, para nós eram verdadeiras relíquias. Quando
as peças eram repetidas trocávamos, uns com os outros.
Nas caminhadas, percorríamos toda a cidade. Numa
incansável romaria, íamos aos bares do Toshio, do Otávio, do Mori, do Anami, do
Iwai, além de procurar as jogadas nas sarjetas. Os adultos, com suas
preocupações e afazeres cotidianos, nem prestavam atenção naquelas
brincadeiras. Para nós, era uma diversão tremenda.
Já naquele tempo pretérito, ainda sem
conhecer o mundo lá fora, estávamos guardando objetos de somenos importância,
mas, que um dia, seriam tidos com relíquias. Mal sabíamos que estávamos
exercendo o ofício de garimpar. O tempo passou, crescemos e nos dispersamos.
Certo é que guardo na lembrança tudo aquilo.
Tempos atrás, ao retornar à velha cidade de
minha infância, deparei-me com uma Galeria de Fotos antigas. Ao visitar o
local, viajei no tempo e, de novo, me vi perambulando pela cidade a procura de
algo que, um dia não existiria mais. A partir de então, as fotos também seriam
verdadeiras relíquias do passado.
Nas fotos ali expostas, consegui identificar
conterrâneos que já não estão entre nós, pois partiram antes do combinado. Já
outros que, por ser crianças à época de minha infância, o tempo encarregou-se
de mudar a fisionomia e que, por isso, não os reconheci. Imóveis que deram
lugar as construções modernas, também estavam ali, numa luta incansável para
preservar a memória da Terra Natal.
De pronto procurei saber o nome do
idealizador do “Museu de Fotos”, ou melhor, do garimpeiro. Eu tive a grata
alegria em saber, que o garimpeiro era o Enéias, meu conterrâneo e eterno amigo
de infância. Eu, curioso como sempre fui e por amar a cidade demais, quis saber
como nasceu à ideia de criar aquele espaço relacionado à preservação da memória
daquela cidade tão querida.
Néia, como é carinhosamente conhecido, relatou-me: “Em 2008, um grupo de amigos reunidos no Bar do Zé Lagarto, tiveram a ideia de postar fotos antigas no bar. Fotos de festas, bailes, formaturas, jogos de futebol, entre outras. A partir daquele momento, foi reunida mais de seis mil fotos e construída uma Galeria de Fotos, na Rua Duque de Caxias, nº 295, centro, Guaimbê SP, onde, antes, era o Posto Esso. Os próprios amigos e conhecidos iam garimpando e trazendo as fotos.”. As grandes conquista, começam com pequenos sonhos. É fato!
Eu vejo que, não só as crianças tinham a mania de colecionar e guardar coisas, que entendiam ser de grande importância. Se não fossem eles, isto é, o Pitiulica e o Néia, junto com seus amigos, loucos ou não e com suas manias, a história não seria preservada e estaria perdida no tempo.
Eu fui buscar no Dicionário Aurélio, o
significado das palavras garimpar e garimpo. Veja o que encontrei: Garimpar - exercer o
ofício de garimpeiro. Explorar preciosidades, especialmente literárias e
documentais. Garimpeiro - o
que procura metais e pedras preciosas na terra.
Eu quero deixar registrado aqui, que rendo
minhas homenagens e meu reconhecimento ao Enéias e seus colaboradores, meus
eternos conterrâneos, por não deixarem a história de minha Terra Natal se
perder no tempo;
Um povo sem passado e sem memória é um povo
natimorto.
Peruíbe SP, 02
de abril de 2022.
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