domingo, 28 de abril de 2024

"SEO" FUJIRO NACOMBE

 

Adão de Souza Ribeiro

 

                              “Seo” Fujiro Nacombe, era um japonês de invejável sabedoria milenar. Ele morava defronte minha casa, lá na sagrada Terrinha. De idade já avançada, tinha uma peculiaridade no jeito de andar, como quem não tem pressa de chegar. A maneira de falar mansa e pausada, cativava a todos seus interlocutores e ouvintes. Eu, por exemplo, adorava estar a seu lado e ouvir suas histórias. Penso que foi com “seo” Fujiro Kacombe, que peguei gosto pelos causos.

                        O nosso personagem, era patrimônio vivo do lugarejo. As crianças da minha infância, como todas do mundo, brincavam e corriam o tempo todo, com suas traquinagens. Mas quando ele surgia na calçada, defronte sua casa, todas elas se juntavam ao redor. Podia-se ver nos olhos do nipônico, o prazer de conversar com os infantes.

                        Ele atendia todas as curiosidades dos pequeninos. Gostava de contar histórias do povo do Sol Nascente. As aventuras dos samurais, as vestimentas e as danças típicas, encantavam as crianças. As Gueixas tinham uma beleza estonteante. Também explicava como a Terrinha, fora desbravada pelos seus ancestrais, isso no início do século.

                        Ele era filho legítimo do Japão, pois aqui chegou em 18 de junho de 1908, no navio Kasato-Maru, numa viagem de 45 dias, desembarcando em Santos SP. Veio com 793 passageiros, oriundos de Kobe – Japão. Esta é a razão pela qual a Terrinha tinha uma grande quantidade de japoneses e seus descendentes (nissei, sansei e yonsei).

                        Para agradar as crianças da Terrinha o “seo” Fujiro Nacombe gostava de oferecer guloseimas, tais como, Taiyaki, Wagashi, Dorayaki, Dayfuku, Manju, Warabi Mochi, Sanshoku Dango e Crepe Japonês. Eu, particularmente, gostava de suhi, sashimi e mani japonês. Olha que a molecada foi, aos poucos, se adaptando com o gosto daquelas guloseimas. O anfitrião nipônico, caprichava na confecção de tudo aquilo.

                        O que causava grande admiração, eram os ensinamentos e conselhos que ele dava para molecada. Pode-se dizer que foi com ele, que aprendemos a respeitar os idosos e amar a natureza. Lá no Sol Nascente, a velhice é sinônimo de sabedoria e experiência. Cuidar da natureza e defender o planeta, representava a sobrevivência da raça humana. Cansei de ver os japoneses, de madrugada, trabalhando na lavoura. Eles são apaixonados pela terra e pela lavoura.

                        O “seo” Fujiro Nacombe tinha umas nisseis (filhas) lindas demais. Quando se vestiam com kimono, era de fazer o padre interromper a santa homilia, na igreja matriz. A filha Sayuri, casou-se com Anderson, meu amigo de infância. Precisa ver os rebentos, uns mestiços lindos, nascidos daquele casal! A Terrinha tinha orgulho dos yonseis (netos) do “seo” Fujiro Nacombe.

                        As lindas festas da Independência do Brasil, realizadas no campo de futebol, tinham o toque das mãos dos japoneses. Ao término do desfile, a população dirigia-se para aquele local. Nunca vi um povo tão patriota, como eles. Naquele dia festivo, patrocinavam barracas de quitutes tradicionais de diversos países, danças típicas, competições engraçadas, prêmios para molecada e por aí se vai. O evento transcorria até o pôr do sol. Nem é preciso dizer, que o “seo” Fujiro Nacombe, nosso ilustre personagem, era um dos líderes daquela inesquecível festança.

                        Até hoje, trago a doce lembrança daquele saudoso ancião oriental, sentado na calçada da Rua Rui Barbosa a nos presentear com seus causos e vários pratos de guloseimas do país asiático. Ainda continua viva na memória, a eterna lembrança do jeito de andar e da voz mansa a nos dar conselhos sobre a vida e a nos ensinar a respeitar os idosos e a natureza. A hospitalidade sempre foi a marca registrada dos filhos do Sol Nascente.

                        Ao “seo” Fujiro Nacombe, digo: “Shin`ainaru yujin, Sayonara, mata aimasho.” (Querido amigo, adeus e até logo).

 

Peruíbe SP, 28 de abril de 2024.

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