Adão de Souza
Ribeiro
O vilarejo era povoado, na sua quase
totalidade, por casinhas de madeira e de pau-a-pique. E as casas de alvenaria,
tinham os rebocos caídos, denunciando que já estavam carcomidas pelo tempo.
Todas as ruas eram de chão batido, onde os pássaros faziam caracol, no areião.
As frondosas árvores centenárias fincadas, onde deveriam ser calçadas,
proporcionavam deliciosas sombras, em tardes de verão.
O povo simples e de costumes simples, seguia
calmo a lida diária. Muitos rumavam cedo para a lavoura, enquanto outros
tentavam sobreviver com o comércio mirrado. Um cachorro magro e pestilento
caminhava cabisbaixo pela rua. As mulheres, entocadas em casa, cuidavam do lar
e do sagrado dever de educar os filhos para o futuro. Que futuro, meu Deus?
Os quintais, sem muros divisórios ou
frontais, eram sinônimos de boa convivência entre os vizinhos. Eles (quintais)
repletos de árvores, plantas e flores, viviam harmoniosos entre si. Lá no alto,
no pé de mexerica, havia o ninho de fogo-pagô, com três ovinhos. Borboletas de
cores variadas e pequenos pássaros dividiam o espaço, em busca de alimentos.
Os moleques, de short, sem camisa e
descalços, brincavam ininterruptamente, para lá e para cá, isso do amanhecer até
o entardecer. Já as meninas, montavam cabaninhas debaixo das laranjeiras e
brincavam de casinha, cuidando de suas filhas (bonecas). Na chaminé, a fumaça
avisava que o almoço estava a caminho.
O vilarejo era um dos lugares mais quentes,
na região noroeste do Estado. O céu de brigadeiro servia de cenário para
coreografia do bailar das andorinhas. O badalar do sino na torre da Igreja Matriz
anunciava que já era meio dia. Tudo ali inspirava paz e tranquilidade.
De repente, tudo começou mudar. Já passava
das dezesseis horas, quando o céu começara mudar de cor, onde o azul celeste,
fora dando lugar ao cinzento, para em seguida, escurecer, tornando-se negro.
Não demorou, para que o dia virasse noite. Aos poucos, uma nuvem carregada foi
liberando as primeiras gotas de chuva, seguida de raios e fortes rajadas de
trovões. Recolhemos às pressas e nossos pais trancaram portas e janelas.
As gotas, que no início eram suaves, começaram a fazer barulho no telhado de zinco, sem forro, bem como, nas portas e janelas de madeira rústica, como se fossem bolinhas de gude. O som era tão forte, que parecia um bombardeio. Na realidade, eram granizos de diversos tamanhos.
Da fresta da janela, podíamos ver os galhos das árvores envergarem para lá e para cá, resistindo aos ventos fortes. Não se ouvia o gorjear dos pássaros, o cacarejar das galinhas no poleiro e muito menos, o bailar das borboletas.
Meus pais, de fé inabalável, puseram-se a
rezar longas e intermináveis orações. As velas acesas no oratório, quase se apagavam
com o vento, que entrava pelas frestas da janela. Minha mãe lançara no quintal,
os “ramos santos”, benzidos pelo padre Antônio e recebidos no “Domingo de Ramos”, para acalmar e parar a tempestade.
Meus pais, meus irmãos e eu, reunimo-nos num dos quartos, para esperarmos a
tormenta passar.
Diante daquela tormenta, parecia que o céu
desabara sobre minha Terra Natal. Eu, tremendo de medo ali no quarto, pus-me a
pensar nos ovinhos do fogo-pagô, lá no
pé de mexerica, nas galinhas em seu poleiro, nas borboletas, nas andorinhas e
nos conterrâneos em seus paupérrimos casebres. “Deus há de protegê-los e
confortá-los”, eu pedia ao Pai Celestial, em pensamentos.
“Por que será que Deus permite que a natureza
haja com tamanha violência contra aquele lugarejo?”, eu pensava
enquanto tudo acontecia. Nada compreendia. Hoje, diante de tudo o que vejo, isto
é, as agressões contra a natureza e os homens agindo uns contra os outros como
animais, eu compreendo que aquele “Dia de Tormenta”, era Deus demonstrando o
seu infinito poder sobre a terra e os homens. Certo é que todos pagam, isto é,
os bons e os ruins.
No dia seguinte, a situação em que eu vi o
lugarejo, conto depois. Por hoje, chega de tanta tragédia!
Peruíbe SP, 09
de março de 2022.
3 comentários:
Planeta de provas e expiação não e moleza não somos espíritos maus atrasados ninguém escapa das semeadoras que fizemos
Parabéns Adão...como sempre os seus contos são muito bons.
Parece até que eu estava lá, passando por toda aquela tormenta!!!
Explendido conto meu amigo até parece quê aconteceu em Guaimbê háuitos anos atrás quando chegamos a cidadezinha não tinha luz elétrica! Parabéns Adão !! Abraços!!
Postar um comentário