sexta-feira, 20 de outubro de 2023

O PRÍNCIPE DAS ARÁBIAS

 

Adão de Souza Ribeiro

                        Por muito tempo, correu um boato de que o Príncipe das Arábias, cansado das mesmices do reino, decidiu perambular pelo planeta. Pediu permissão ao Rei Mustafá, seu pai, colocou uma alpercata nos pés, uma porchete na cintura, um óculos ray-ban nos olhos, calça e camisa de algodão e um punhado de réis no bolso. “Não sei o que se passa na cabeça desse menino”, pensou o monarca.

                        Não me pergunte como, o menino rebelde foi parar lá na minha Terrinha. Com toda sua dinheirama, podia conhecer o Museu do Louvre, em Paris; as muralhas da China, os jardins suspensos da Babilônia, em Eufrates; a estátua da Liberdade, em New York, mas, não, foi conhecer a Sagrada Terrinha. Naquele tempo, não havia Wase, GPS e nem o Google.

                        Bem, isso não importa, mas, sim, que estava na Terrinha. Travestido de cidadão comum, passou despercebido entre os conterrâneos. Ele tomou cachaça no bar do Anami, do Iwai, do Mori, do Toshio e do Valenciano. Durante a agradável estadia, pernoitava na pensão da Rua Ruy Barbosa.  Aos poucos conquistou a simpatia de todos.

                        Sem perceber, ele foi se abrasileirando, ou melhor, se acaipirando. Nas tardes preguiçosas de domingo, assistia um jogo de futebol no campo, atrás da Delegacia de Polícia e à noite, passeava no jardim da Praça Matriz. Ele trocou o luxo palaciano, pelas coisas simples do lugarejo. Aquilo lhe fazia tão bem.

                        Causava estranheza o jeito de andar, vestir e falar, mas as pessoas eram humildes e discretas, por isso, não o questionavam sobre sua origem.  Ele tinha a fantasia de ser pobre, sem ter ao seu lado, os costumeiros bajuladores. Para ele, o pobre era mais sincero e, ao que parece, não se enganou.

                        O Príncipe das Arábias se encantou com a comida, a dança, a música e os costumes do lugarejo. A dança do ventre, deu lugar ao catira; o estilo musical waslat, deu lugar ao sertanejo, a comida babaganuche foi trocada pela feijoada. Pelo que se vê, a Terrinha tornou seu reino, isto é, o Reino Encantado Tupiniquim.

                        Para ele, as pessoas serem conhecidas por apelido, soava engraçado. Não demorou muito e ele recebeu um, ou seja, o “brimo Habib”. Como o lugar era pequeno e todos se conheciam, o recém-chegado em suas andanças, não por acaso, acabou conhecendo a Casa das Primas. Elas se abrigavam em casas de madeira e não em suntuosas mansões, como se esperava.  Ganhou delas, um agradinho sexual.

                        Quando deixou o castelo real, para se aventurar pelo mundo dos desvalidos, comprometeu-se com seu pai, que não demoraria. Ao que parece, não foi o que aconteceu. Muita coisa o prendia ali, tais como: pescar tilápias e dourado no açude do Ademir; caçar codorna e capivara, nas matas circunvizinhas e em companhia do Sabino; ordenhar as vacas, no sítio do Hermininho. Tudo aquilo, encantava-o por demais.

                        A vida no reino, era enfadonha e ali, na Terrinha, não tinha compromissos oficiais e nem paparazzi no seu calcanhar. A vida é uma caixinha de surpresa. Um belo dia, o “brimo Habib” foi laçado pelo coração. Num dos passeios pela Praça Matriz, engraçou-se pela menina Euflosina, uma fogosa mulata e filha de um comerciante.

                        O rei Mustafá, genitor do “brimo Habib”, enviava mensalmente, dinheiro a ele e era um valor apenas para sua sobrevivência. Não se sabe ao certo, se o flerte se vingou. Embora o menino fosse muito atraente, por ser uma mulher recatada, ela não queria ficar malvista e mal falada diante dos conterrâneos. Afinal de contas, pouco se sabia sobre a origem e a família do pretendente a ser seu dono e seu consorte.

                        Meu Deus, mal sabia ela, que o casamento com “brimo Habib”, seria melhor do que ganhar sozinha na mega sena. Durante o tempo que ele habitou na Sagrada Terrinha, ninguém sabia ou desconfiava, que ele era herdeiro do Reino das Arábias. Só eu, é claro! Se não soubesse, não estaria contando este causo aos assíduos leitores.

                        Hoje, posso dizer sem medo de errar, que um Príncipe Real, de sangue nobre, passou por aqui, na minha Sagrada Terrinha, ou melhor, pelo Reino Encantado Tupiniquim.

                        God save our Prince! (Deus salve nosso Príncipe).

 

Peruíbe SP, 20 de outubro de 2023.

Nenhum comentário: