Adão de Souza
Ribeiro
Numa cidadezinha do interior, encravada no Noroeste
do Estado, havia um homem, que perambulava pelas ruas. Para uns, ele era um
louco, mas, para outros, um sábio. No entanto, para os incrédulos, não passava
de charlatão ou adivinho. Certo é que as pessoas gostavam de ouvir suas prosas,
carregadas de simbolismo. Isso ocorreu lá pelos anos idos de 1960 e 1970, da
Era Cristã.
A sua aparência, causava encanto e ternura.
Ele era um ancião, moreno, estatura mediana, levemente arcado, magro, cabelos longos e
ondulados, dedos finos e longos, nariz adunco, olhos azuis, voz suave e
cadenciada e de passos lentos. Costumava vestir-se numa túnica branca, alpercata
de couro nos pés, um boné tricotado e esverdeado em forma de touca, um
crucifixo dourado no pescoço, preso a uma corrente da mesma cor.
De vez em quando, era surpreendido falando
com as flores do jardim da Praça Matriz ou com os pássaros pousados numa
quaresmeira – tibouchina granulosa (melastomataceae)
- florida. O engraçado, era que as aves respondiam com cantos, dando a entender
que o compreendia. Bob Marley, um cachorro vira-lata, de cor caramelada, não se
desgarrava dele. Os conterrâneos, davam-lhe marmita, salgados ou guloseimas, que
ele dividia carinhosamente com o cachorro. Bob Marley educadamente agradecia,
abanando a calda.
O nome dado ao canino, fora uma singela
homenagem a Robert Nesta Marley, cantor e compositor de reggae, de origem
jamaicana, mais conhecido por Bob Marley.
As pessoas humildes da cidadezinha, por não saberem pronunciar palavras
estrangeiras, chamavam-no simplesmente de Bobi. O dono, por sua vez, era chamado
carinhosamente de Sócrates - o pensador.
Os moradores sabiam que era de família
humilde, isto é, o pai um lavrador e a mãe, uma parteira muito respeitada. De
pouco estudo, pois cursara só o primário no “José Belmiro Rocha”. As pessoas
atônitas, perguntavam: “ Mas de onde vinha tamanha sabedoria?
”. Os irmãos cresceram e ganharam asas e partiram mundo afora, mas ele
permanecera ali, ou seja, preso as suas raízes.
A preocupação do protagonista do que se
pretende narrar, era preservar a história e os costumes do lugarejo; alertar
sobre a contaminação do progresso, a perda da ética, moral e bons costumes; a
morte da fé, etc. e tal. Nas longas
horas de conversa com quem procurava ouvi-lo, nunca quis manipular opiniões
alheias,
Nas conversas prazerosas com ouvintes e/ou
interlocutores dizia, dentre tantas coisas, que num futuro não muito distante,
as estações do ano se misturariam; os filhos se revoltariam contra os pais,
chegando a matá-los; em nome da ganância, nações invadiriam outras nações,
provocando guerras atômicas; tentariam conquistar outros planetas, violando a
divina criação.
A depredação da natureza, enchentes,
terremotos, incêndios, secas devastadoras, fomes continentais; adultério; prostituição;
pedofilia; homossexualismo; destruição das famílias; falsos profetas; políticos
corruptos, afrontas a Deus, seriam apenas sinais do fim dos tempos.
Pelas falas simplórias daquele homem,
acreditava-se que era o motivo pelo qual optara em permanecer naquela
cidadezinha, porque ela não fora contaminada pelos atos pecaminosos, ganância e
luxúria do mundo lá fora. Ele se contentava viver somente com o necessário,
nada mais do que o necessário. Os amigos de infância, que foram se aventurar
pelo mundo distante, acabaram perdendo a essência da vida.
Depois de terminar a prosa com seus ouvintes,
ele sempre finalizava, dizendo: “Preste bem atenção no que eu digo e, depois,
não me venha com chorumelas, quando chegar o fim dos tempos”.
Peruíbe SP, 20 de
abril de 2023.
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