sábado, 27 de fevereiro de 2010

A DOR

O que é a dor, senão a expiação do corpo e a lapidação da alma.
Através dela, reconhecemos a nossa fragilidade perante as forças da natureza. Também a infinita presença do Criador; pois é nesse instante, que clamamos a sua piedade e cura. Nada mais reconfortante do que sabermos que somos um pequenino grão de areia em relação ao Universo.
Ora, só a dor tem o dom de despertar a nossa consciência para as coisas simples da vida. Ninguém mais sabe nos conduzir pelos caminhos da humildade. Quando estamos acometidos da dor, tornamo-nos dependentes do próximo e, muitas vezes, daquele que pensávamos não precisar jamais.
Não é o remédio que cura a dor, mas a fé em Deus e o carinho das pessoas que nos cercam. A certeza de que não estamos sós, é o maior antídoto contra todos os males, que assolam nosso corpo, nossa alma e nosso espírito. O bálsamo que nos envolve de ternura, vindo da mão amiga, tem sua essência extraída da dor.
Os longos momentos de felicidade, jamais terão o mesmo sabor do que os instantes de intensa dor. A felicidade, embora de origem abstrata como a dor, têm efeito rápido, como os ventos de leste. Já a dor, com toda sua sutileza, dura uma eternidade, embora, muitas vezes, não passa de fator psicológico.
A dor do parto, da ausência, da saudade, da perda, da decepção, da traição, da hora derradeira e tantas outras, cuja memória não tem desejo de relembrar, escraviza nosso corpo e nos faz redimir perante o próximo. Ensina-nos a pedir perdão, rasgar o manto da vaidade e envergonhar-se da tirania que exercemos contra a natureza e as pessoas à nossa volta. Sempre acreditei que o sofrimento purifica a alma.
Só quem passa pela dor, conhece os íngremes caminhos a serem vencidos, cujo objetivo maior é estar mais próximo da perfeição humana. Não conheço pessoas humildes no meio daqueles que desfrutam as mordomias, que a fortuna lhes proporciona. A humildade creio eu é a filha primogênita da dor. Por isso, quando estou sob égide da dor, sinto que estou mais próximo de ver a face do Criador.
Mas a dor também tem o dom de aproximar os homens, as nações e os ideais. A dor do Tsunami uniu as nações, em torno da reconstrução; a dor do Airton Sena, uniu o país verde-amarelo, para superar um enorme vazio; a dor de Tiradentes, uniu um ideal de liberdade, para sufocar a tirania. Enfim, a dor de um ente querido, une toda uma família, para não perecer a raiz, a tradição.
A beleza da vida, começa com a dor do parto.
Peruíbe SP, 19 de março de 2006

Nenhum comentário: