Adão de Souza
Ribeiro
A nossa mente é fértil, tanto para o bem,
quanto para o mal. Claro e sem contar, para o humor. Eu creio que esta virtude
é só dos brasileiros, pois nunca vi um povo fazer tantas piadas e achar graça
de tudo.
Até nas tragédias do cotidiano, ele acha um
espaço para fazer uma piada e arrancar longas gargalhadas. Diga-se de passagem,
um povo sofrido, porém, alegre. Os estrangeiros que aqui aportam, acabam
ficando. Isso por conta desse humor que ele tem enraizado nas veias.
Outro dia, ao acordar depois de um sono
abençoado e tranquilo, fiquei pensando como seria se Vossa Santidade, o Papa,
fosse brasileiro e não só isso, se a Santa Sé, ficasse aqui na nossa “Pátria
amada, Pátria minha e Mãe Gentil”.
Para tornar mais real o sonho, como seria se
Roma localizasse na minha Terra Natal e o Papa, um dos meus amigos de infância?
O Papa mais palpável e mais humano e não aquele trancafiado num carro de vidro
todo blindado, escoltado por soldados da Guarda Suíça Pontifícia, em latim Custodes
Helvetici? Uma miragem.
Na eleição daquele que iria postular o novo Papado,
ocorreria de tudo aos moldes do sufrágio nacional, isto é, ataques à vida
pessoal e social do cardeal/candidato. Iriam buscar nas profundezas do seu
puritanismo, alguma mancha e, se não tivesse, arranjariam.
Como por exemplo: Lembra-se daquele dia, que
ele tomou vinho, sem ser o sangue de Cristo? Dos passarinhos que, na infância,
matava com estilingue. Da Claudete, aquela namoradinha dos tempos do grupo
escolar? Uma enxurrada de fatos que era de somenos importância e que a partir
de então, teriam uma conotação enorme, na vida do Sumo Pontífice.
Para mim, antes de tudo, era uma honra enorme,
tê-lo como amigo das peraltices infantis lá na nossa Terra Natal. Aquele
menino, que nada tinha de diferente dos outros, agora era o Papa, ou seja, o
chefe supremo da Santa Igreja Católica. Manoelzinho, o mais briguento da turma,
disse que iria pedir um “bico” de sacristão, na Basílica de São Pedro, que
ficava perto da Casa da Lavoura.
Era nítido no meu sonho, que no dia em que os
arcebispos estavam reunidos no Conclave, na Capela Sistina, todos nós da
terrinha, ficamos defronte a Basílica esperando a tal da fumacinha. Pedrinho,
filho da marafona Lilica, comentou: “Se aparecer uma fumaça branca é que temos um
novo Papa e se for preta, é que a escolha está embaçada.”
Assim que apareceu uma branca, a folia foi
geral. Todos correram para o “Bar do Toshio”, na esquina da Rua Rui Barbosa com
a Rua Almirante Barroso, onde rolou cerveja, cachaça, muitos comes e bebes e
músicas de todos os gostos. O Papa lá das bandas da Europa, gostava de música
clássica, já o nosso gostava de samba e pagode.
E quando soubemos que o escolhido fora o meu
preclaro amigo Farias, o Pré-Histórico, a coisa debandou de vez. A festa
atravessou a noite, sendo que até as beatas e as noviças entraram na gandaia.
De um lado, rojões de todos os calibres; do outro, as mulheres mais recatadas,
em vigílias religiosas, agradecendo a escolha do novo comandante e pedindo a Deus, sabedoria
para que Farias pudesse conduzir o rebanho, principalmente, o das ovelhinhas desgarradas dele.
A partir daquele dia, nasceu em mim, um misto
de alegria e de tristeza. Alegria por saber que o sonho de Farias se realizara;
tristeza, por saber que não teria mais a companhia do nosso preclaro amigo.
Certo é que ele não iria, por força do cargo, participar das farras e não
iriamos mais ouvir as suas lorotas, onde ele contava vantagens de fatos não
acontecidos. Ele arrotava heroísmo e valorizava as suas milongas.
Eu quero que não se esqueçam de que tudo que
está sendo narrado, não passa de sonho fruto da mente fértil de quem não tem
nada para fazer. A cidade, o Farias, o “Bar do Toshio” e eu, somos reais. Agora
a história narrada, a deixa habitar no mundo imaginário de cada leitor assíduo.
Quando eu o visse, depois de Farias ser
coroado Papa da “Era Moderna”, com imenso júbilo, eu diria aos santos ouvidos
de Vossa Santidade: “Agora o nosso Papa é pop!”
Peruíbe SP, 16
de janeiro de 2022.
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