Adão de Souza
Ribeiro
Austregésilo de Castro, o Cacá, era um
conterrâneo e sábio conhecedor de fenômenos paranormais e ufologia. Estudioso
no assunto, angariou admiração de todos da Terrinha. Ele passava madrugadas
inteiras, debruçado em livros e pesquisas, contando com auxílio da NASA.
O conterrâneo instalou no quintal da casa, um
observatório rudimentar, com a lente direcionada ao espaço sideral. Dali
analisava as galáxias e o movimento dos asteroides. Também haviam antenas, onde
ouvia os sons do Universo. Com aquela parafernália, rastreava a vida pacata da
cidade.
Cacá, gostava de tomar cachaça com cynar, o
famoso rabo-de-galo. Não se separava do seu boné, estilo Sherlock Holmes.
Dividia os momentos de lazer, no “Bar do Otávio”. Nas conversas de boteco,
sempre falava da sua fascinação por ufologia e fenômenos paranormais. Alguns
amigos o chamava de “Gênio” ou “Lunático”.
Já no início da noite, caminhava sozinho,
pela rua deserta e rumo ao Bar do Otávio, quando estando ao lado da Praça
Matriz e defronte os Correios, um forte clarão ofuscou a sua visão. Ao se recobrar,
percebeu que estava dentro de uma nave, um OVNI. Os tripulantes, eram seres
estranhos e a nave, composta de uma tecnologia avançada e jamais vista por mortais.
O aparelho sobrevoou a cidade, para, depois,
ganhar o espaço. Lá do alto, viu que a terra era um minúsculo ponto e um clarão
no Universo. Sentiu a garganta ressecada e a falta do “rabo-de-galo”. De repente a nave pousou num lugar lindo. O
chão era feito de nuvens brancas, alvas como algodão. Ali encontrou velhos
amigos da Terrinha, que viajaram antes do combinado.
Ele viu crianças brincando; uma orquestra de
passarinhos; a estrada toda florida; lagoa, de águas cristalinas; estrelas
cintilantes, brilhando em todos os lugares; pessoas caminhando lentamente, como
se estivessem flutuando; via-se o semblante de felicidade em todos que ali
habitavam. As pessoas eram todas iguais, usavam túnica branca e caminhavam
descalças.
O tempo era infinito e, por isso, não havia
relógio. Os seres não eram conhecidos
pelo sexo ou cor da pele, pois isso não havia ali. Todos tinham o mesmo tom e
timbre de voz. Cacá ficou boquiaberto com tudo o que via, pois, o lugar
transmitia paz e encanto.
Como foi o único ser humano a estar ali,
assumiu o compromisso, sob juramento, de nunca divulgar o que viu. Aquele
lugar, haveria de ser sempre uma especulação ou imaginação, na mente dos
terráqueos. “Na minha casa, há várias moradas. ”, João 14:2, palavras do
Criador.
Enquanto Cacá permanecia naquele mundo
transcendental, a vida lá na terra, ou melhor, na Terrinha transcorria
naturalmente. Ao perceberem o sumiço de Cacá, o povo iniciou uma busca
incessante. Juvêncio, o detetive Faro-Fino, com Brutus, o seu cachorro
farejador, foram chamados para empreitada.
Havia mil conjecturas sobre o desparecimento,
mas nenhuma pista plausível. No local onde foi abduzido, só encontraram o boné.
Nenhum sinal de pegada humana ou de pneus de veículo. Brutus, sentiu o odor de
Cacá só até ali. A partir de então, deu-se início aos comentários e
diz-que-diz.
Carmosina, moradora ao lado do Correios,
disse: “Eu vi uma gerigonça luminosa, parar no meio da rua. Uns bichos
estranhos, depois de apanharem Cacá, saíram voando pelo céu e desapareceram.”.
Como a mulher era fofoqueira e mentirosa de carteirinha, ninguém quis dar
crédito.
Porém, quando a NASA soube da narrativa de
Carmosina, enviou cientistas renomados para a Terrinha, a fim de investigar a
veracidade do fato. Os aparelhos
espiões, lançados no espaço, pela Rússia e Estados Unidos, não detectaram nada
de estranho, nos céus da Terrinha. Isso prova que, nem mesmo a NASA, conseguia
desvendar os mistérios, que rondavam a Terrinha. Com os cientistas, vieram a
imprensa do mundo inteiro, para explorarem o ocorrido e venderem
sensacionalismo.
O Paço Municipal hasteou a Bandeira da cidade
a meio mastro, em sinal de respeito ao ilustre munícipe desaparecido. No prostíbulo,
as primas entram em jejum, deixando de prestar relevantes serviços aos assíduos
clientes.
Na igreja houve evasão dos fiéis, redundando
em queda na arrecadação do dízimo e das ofertas dominicais. Aquilo deixou o
padre preocupado, pois, sem arrecadação, ele seria transferido. A cidade estava
em pânico total.
Matilde, uma velhinha muito debilitada,
chorava copiosamente a ausência do filho amado. Realizou-se procissões,
promessas e cultos em todas as religiões, inclusive, as de matrizes africanas e
orientais. O povo irmanou-se numa só
causa e objetivo, ou seja, na volta de Austregésilo de Castro, o Cacá.
Passado um ano, quis o destino que, numa
noite, no mesmo lugar e horário, o lunático Cacá fora deixado de volta. Carmosina não
presenciou a chegada triunfal, porque não estava sentada na caldeira de balanço,
na entrada da casa. Ficou triste e entrou em depressão.
Ao verem o conterrâneo ali, todos correram
para abraçá-lo e saberem o que aconteceu. Como ele estava abilolado limitou-se
a dizer: “Eu não me lembro de nada”. Os cientistas, após intenso
interrogatório, concluíram que ele falava a verdade.
Após alguns dias, depois de recobrar os
sentidos, lembrou-se onde estivera e o que viu por lá. Porém, conforme
compromisso assumido, não revelaria. Fato é que ele passou a sentir saudades
daquele mundo surreal. O que ele mais queria, era tomar uma dose do
rabo-de-galo, no Bar do Otávio, em companhia dos velhos amigos.
A partir daquele fato inusitado, os seus
estudos e pesquisas, não ficaram apenas no campo das teorias e, portanto,
ganharam mais robustez. Ao passar pela experiência vivida, Austregésilo de
Castro, o Cacá, certificou-se de que a vida além da imaginação, não era apenas
uma alucinação, mas a verdadeira realidade. Basta acreditar.
Peruíbe SP, 20 de
dezembro de 2023.
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