quinta-feira, 21 de novembro de 2013

O SABOR DAS PALAVRAS


                   Dizem que a língua portuguesa é a mais complexa, porém, a mais precisa, quando procura decifrar o significado exato de algo. Conjugar os verbos no tempo correto, definir o que é sujeito e o que é do predicado, dizer se é oxítona, paroxítona ou proparoxítona e os advérbios é, sobremaneira, muito difícil. Outras línguas,  podem soar bonitas aos nossos ouvidos, mas a nossa tem um sabor diferente. Os nossos lábios se deleitam ao pronunciarem palavras rebuscadas, arcaicas ou chulas.

                   Desde a tenra idade, tenho feito da palavra, a minha ferramenta de trabalho e de prazer. Há uma cumplicidade entre ela e eu, coisa de autoflagelação, uma simbiose inexplicável. Vou ao orgasmo, quando redijo uma poesia ou uma crônica. Viajo no mundo das letras, como se eu estivesse comandando uma nave interplanetária. Só eu sei o bom e quão suave é ser brasileiro e ter a língua portuguesa, como a língua pátria.

                   Um dia desses, passei a observar com carinho a minha esposa e, em especial, quando ela pronuncia algumas palavras em meio a frases simples e desprovidas de vaidade. Uma palavra sem sentido e, descontraidamente, colocada no meio de uma frase, tem um sabor inigualável. Não só pela palavra em si, mas pela forma como minha esposa a pronuncia. Dá uma vontade louca de comer aquela palavra catchup e mostarda.

                   Os olhos dela brilham, quando os lábios balbuciam a palavra “óbvio”. O rosto se contrai de felicidade e há uma metamorfose silenciosa por todo o seu corpo. Não sei se ela já procurou no dicionário, o significado daquela palavra tão pequena e tão doce. Penso que não deve matar tal curiosidade, pois, ao saber, perderá a graça, o encanto, o sabor. A inocência de quem a pronuncia é que transforma aquela palavra num tesouro de valor impar.  

                   Foi com o jeito simples da minha esposa, que aprendi o valor imenso que a palavra exerce sobre nossa vida... nosso cotidiano. A nossa língua não é só para degustar o alimento ou para oscular a face, mas, acima de tudo, para expressar o sentido exato daquilo que pensamos ou sentimos. Foi com minha esposa, que aprendi que o obvio não é apenas o que está claro, evidente, que salta aos olhos; mas, sim, aquilo que enche a boca ao ser pronunciado por ela.

                   Aprendi, isso sim, que a amo demais e que é óbvio que salta aos nossos olhos (meu e dela) que nascemos um para o outro. O que não traduz esse nosso sentimento é óbvio que não consta do nosso coração e nem no dicionário do “Aurélio”.

                   O óbvio pelo óbvio, deixa como está.

 

Peruíbe SP, 21 de novembro de 2013

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