domingo, 4 de julho de 2021

CAIPIRA ENVERGONHADO

 

Adão de Souza Ribeiro

 

                        Eu estou farto deste mundo de hoje. Esta conversa narrarei na primeira pessoa do presente do indicativo, porque pretendo expressar a opinião particular daquilo que sinto e penso sobre os tempos modernos. Não há nenhuma pretensão em demonstrar que sou o suprassumo do conhecimento e da verdade, na humilde narrativa das mudanças pós século XXI. Apenas desejo que o diálogo não seja tão desgastante e, por conseguinte, enfadonho.

                        Além do assassinato da língua portuguesa, diante do enxerto de palavras estrangeiras no nosso vernáculo, ainda temos que absorver as tradições e os costumes alheios. E assim, aos poucos, vamos perdendo a nossa identidade. Nós ficamos cegos, diante das mudanças impostas e passamos a ter vergonha das nossas raízes. Nós somos reféns de um modernismo selvagem. Não é por acaso, que esta nova geração tresloucada, segue a esmo um futuro incerto, como um barco á deriva, num mar turbulento, sem bússola... sem nada.

                        Esta geração concebida pela tecnologia e uma enxurrada de informações extravagantes e desnecessárias, envergonha-se de tudo que faz parte de um tempo não muito distante. Não gosta da música sertaneja raiz, leia-se: Liu & Léu, Zilo & Zalo, Canário & Passarinho, Tonico & Tinoco, e por aí se vai. Abominam trajes femininos decentes, isto é, saias longas e rodadas, blusas com colarinhos. E o que não dizer dos tratamentos respeitosos com os pais e as pessoas mais velhas: “Senhor... Senhora, benção pai... benção mãe”.

                        Eu tenho uma saudade imensa das festas juninas; das folias de reis; das lendas do folclore brasileiro; dos bailes no terreirão da fazenda, ao som da sanfona e da viola caipira; das peraltices de criança, nas ruas descalças, da minha terra natal; as longas procissões da padroeira, sob a batuta do padre Antônio; os desfiles de “Sete de Setembro”; do mercado persa, realizado aos sábados, lá no meu torrão natal. É tanta saudade, que não cabe aqui.

                        Já esta geração nutella, tem saudade de que, se nem passado teve? Creio ser esta a razão de se envergonhar. Ela nada construiu, para sentir honra e saudade. E o que é pior, agarrou-se das terminologias e músicas estrangeiras, halloween, funk, rap e tantos outros lixos culturais, como se fossem nossos. No entanto, a geração nutella desrespeita minha Pátria e nada conhecem sobre os símbolos nacionais. Isto não os envergonha; mas a mim, sim!   

                        Eu não sei se é culpa do Governo ou da imprensa marrom, que com suas ideologias perversas, tentam aniquilar o conhecimento de um povo tão simples, belo e hospitaleiro. Lembro como se fosse hoje. Antes de iniciar a aula, o diretor colocava todos os alunos perfilados no pátio, para cantarem o Hino Nacional. A cidade, no passado, fora o celeiro onde se forjou cidadãos trabalhadores e probos.

                        Naquele tempo, a escola cumpria o estrito papel de preparar a criança para o futuro; a igreja não se desviava da missão de ensinar o caminho da salvação; os políticos não governavam debruçados na cartilha do toma lá dá cá; os pais educavam os filhos, de acordo com os princípios da moral, ética e bons costumes e não se prenhavam pelas ideologias dos maus intencionados.

                        Quando desobedecíamos ou fazíamos maldade, nossos pais lançavam mão da vara da infância e juventude, leia-se ramo de marmelo ou de goiabeira. As meninas recebiam orientações femininas, a fim de que, no futuro, fossem excelentes mães e donas de casa. Os meninos, por sua vez, recebiam orientações masculinas, para que no futuro se tornassem excelentes pais e chefes de família. O que era certo, era certo e o que era errado, era errado. Menino brincava com carrinho e bola e menina brincava de casinha e boneca. Cada um no seu quadrado.

                        A molecada colhia a fruta no pé e, ali mesmo, saboreava até se lambuzar.  A mãe separava um frango no terreiro e fazia uma sopa deliciosa com muito tempero. Não havia química nem na fruta e nem no frango, por isso, éramos saudáveis. Comíamos até repetir o prato. As crianças confeccionavam seus próprios brinquedos, uma vez que nada vinha pronto. Eis a razão pela qual, não havia maldade nos corações infantis. Digo que naquele tempo, eu era feliz e não sabia. E o que dizer da geração nutella de hoje?

                        Hoje, passado todos esses anos e eu já adulto e de tanto viajar pelo mundo, feito caixeiro viajante, tendo sobrevivido a várias gerações, fico a pensar: “Não esperava ver tanta aberração e parece ser o fim dos tempos. A cada dia, quer seja nas pessoas, quer seja na natureza, os sinais são gritantes. Pare o mundo que eu quero descer”.

                        De repente, lá no final da Rua Rui Barbosa, um desnaturado e metido a sabichão, fazendo uso de um estrangeirismo, que nem mesmo ele sabia o significado, gritou: “Você é um cringe”. Eu não dei ouvido e continuei caminhando.

 

Peruíbe SP, 04 de julho de 2021.

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