terça-feira, 11 de setembro de 2012

TERRA NATAL


                               Deixei minha terra natal, nos idos de 1975. Lá ficaram minhas memórias de infância e o sonho inocente de ser feliz. Deixar a terra natal é como aceitar a autoflagelação. Dói e como dói, meu Deus! Olhar para trás e ver que, aos poucos, a imagem da mãe acolhedora, vai sumindo na linha do horizonte. Dá uma triste sensação de abandono ou de renegação da própria história. Parece que estamos aceitando a perda da própria identidade. Dói e como dói, meu Deus!
                        É da terra natal, que brota a nossa formação ética e moral, os nossos sonhos infantis, as ilusões de um futuro melhor e até, quem sabe, as nossas fantasias de felicidades amorosas. Ela tem esse dom de nos moldar, porque nos recebe no berço da imaturidade, isto é, com a “moleira” aberta e com a mente propensa ao amor e a bondade. Ela é a mãe generosa, que entrega os seios repletos de amor e que saciarão nossos desejos vorazes de vencermos na vida.
                        Não importa o tamanho da terra natal, porque mãe é sempre mãe. Mas a minha, em especial, por ser pequena, tem um “que” de ternura, de fragilidade, de vontade de pegar no colo. Sabe quando a mãe de tão bela e pura, mais parece filha. É assim a minha terra natal. Suas ruas calmas e descalças, parecem as artérias, por onde correm o sangue eterno da minha existência. Sua praça matriz, tem a geometria exata do meu coração, onde se abrigam as pessoas que dela precisam de carinho.
                        Deixei minha terra natal, nos idos de 1975. Mas a minha alma e meu coração, caminham pelas ruas e praças, em passos lentos e saudosos, porque dela jamais me apartei. Não se cortou o cordão umbilical, porque entre nós, há um laço eterno. Ali repousam meus avós paternos e meu pai e, também, residem parentes meus. Amigos de infância e velhos conhecidos, já não sei. O mundo gira e a vida segue sua rotina, por isso, não sei do movimento de rotação do destino de cada um.
                        Quando deixei minha terra natal, nos idos de 1975, ela passou a ser um quadro pendurado na parede da minha imaginação. Lembro que meu confrade Carlos Drumond de Andrade também sentiu-se assim, quando deixou sua mãe Itabira MG. Suas casas singelas, comércio movimentado, praça florida, ruas descalças, campo de futubel e a festa japonesa realizada ali no sete de setembro, casas de meretricio, parteira "mãe Joana", povo de palavreado acaipirado, frutas no pomar, riachos de águas cristalinas, galinhas no quintal, boi no curral e o lanche no recreio do grupo escolar, são detalhes marcantes na pintura, do quadro pendurado na parede, da minha saudade.
                        Dia desses, resolvi voltar à minha terra natal, motivado por uma incontrolável saudade. Não deveria ter seguido meus instintos, mas fui. Queria dar um forte abraço nela, isso do tamanho da minha eterna gratidão. Queria relembrar de detalhes preciosos, daquele quadro pendurado na parede. Não deveria ter ido, mas fui. Segui os instintos do coração e não da razão. Agi como se fosse um adolescente apaixonado.
                        Ao chegar, fui surpreendido com outra cidade, situada ao norte, onde antes era só mato e que o local era chamado de “caixa d´água”. Isso porque ali existiu um reservatório de distribuição de água tratada. Ruas, casas, comércios e moradores, todos estranhos, portando, não reconheci como parte da minha terra natal. Ao transpor a linha divisória do grupo escolar, adentrei no meu território antigo. Não deveria ter ido, mas fui.
                        Sem pressa, passei a percorrer as ruas da minha terra natal antiga. Meus olhos, como se fossem a lente imperdoável de uma máquina fotográfica, queriam registrar cada detalhe ou sinal de distorção daquilo, que minha mente deixara gravada, no idos de 1975. Portas, janelas, telhados, quintais, cercas, árvores, comércios, praça, ruas, esquinas, nada passou despercebido. Durante aquela busca incessante, entre o passado e o presente, senti que uma lágrima solitária, surgiu no canto do meu olho.
                        Ela traduziu no pequeno gesto, o meu desespero de ver que, além do estado de abandono do patrimônio histórico, eu também não conseguia relembrar com exatidão, onde moravam pessoas que fizeram parte da minha infância. Ao olhar para cada casa abandonada, queria encontrar desesperadamente suas almas interiores, traduzidas pela imagem viva das pessoas que tanto amei e que tanta saudade eu sinto.
                        Para completar essa enxurrada de tristeza, a casa da Rua Rui Barbosa, nº 118, onde vivi, desde os primeiros dias de vida, uma vez que nasci no bairro Glória, foi totalmente modificada, na sua parte frontal. Vi que, num tiro de misericórdia, sepultaram para sempre a minha história. Não quero aqui condenar ninguém, até porque a fila anda e a história serve apenas para registrar momentos inesquecíveis. Mas desejo do fundo da minha alma, dizer a minha terra natal que, em que pese tê-la deixado nos idos de 1975, jamais vou alterar da minha memória, os traços de ternura e de gratidão por ter sido seu filho e dela ter recebido todo o seu afago.
                        Jamais apagará da minha memória, a brincadeiras infantis nas noites enluaradas, correrias nas enxurradas das chuvas de verão, os galhos dobrados de manga bourbon, as algazarras na hora do recreio, as caçadas de estilingue, as boiadas pelas estradas vicinais, a comida no fogão a lenha, o chá de poejo, as história de assombração contadas pela avó, as folias de reis, as procissões e o badalar do sino de madeira, ao lado da igreja matriz, a contemplação do busto dos fundadores e por ai se vai.
                        Sé me resta, nesse mar de saudades, dizer-te: “GUAIMBE SP, MINHA TERRA NATAL, EU TE AMO!”.    

Peruibe SP, 10 de setembro de 2012 

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