terça-feira, 11 de setembro de 2012

REDOMA DE VIDRO

                        “Maria cria a filha numa redoma de vido, temendo que ela seja deflorada antes do tempo”. Talvez essa narrativa, um tanto prolixa, pudesse iniciar assim. Achei bonita a palavra redoma de vidro e, curiosamente, fui buscar no Aurélio *, o seu significado. Portanto, ei-lo: “espécie de campânula de vidro, usada para proteger objetos delicados ou alimentos; manga de vidro, de forma abobadada, para resguardar do ar e da poeira, objetos delicados; (sentido figurado) manter-se em redoma, acautelar-se excessivamente, cuidar-se em demasia, diz-se de uma situação superprotetora”.
                        Fico imaginando, porque as pessoas têm por mania blindarem aquilo que é público e, por conseguinte, de acesso irrestrito. Se fosse de propriedade particular, sou obrigado a aceitar; mas por se tratar de algo de interesse público, isso me revolta. Eu pergunto: “Por qual motivo agem assim?” “Por mero ciúme ou medo de perderem a teta, da qual sonham desfrutar num futuro não muito distante?”.
                        Estamos num período, onde muitos sonham sentarem-se no trono do poder e, outros por sua vez, alimentarem-se das migalhas da bajulação. Nós, com o título eleitoral nas mãos, numa democracia de fazer inveja aos países de primeiro mundo, ficamos sentados na sarjeta da ignorância, assistindo a este espetáculo repugnante. E, o que é pior, regozijamos em ver como se comportam os bajuladores e os bajulados.
                        Em torno dessas pessoas endeusadas, estão seres inescrupulosos, como moscas ao redor do lixo fétido. São como os três mosqueteiros que, por muito tempo, blindaram um ex-presidente e quase o jogou na vala profunda da história desse país. Essas pessoas estão à espreita das benesses pessoais, que possam vir a gozarem, caso os seus protegidos, venham galgar os postos que almejam.
                        Dias atrás, depois de muita luta, consegui chegar até uma das candidatas a prefeita de minha cidade, a quem expus o desejo de colaborar na elaboração de seu plano de governo. Muito gentil, anotou meu telefone e pediu que seu porta-voz, posteriormente, entrasse em contato comigo. Ledo engano eu achar que ele assim o faria. Não tenho objeto de barganha, que despertasse o interesse dele em voltar a falar comigo. Por outro lado, não represento risco para ele e nem para aqueles que desejam, desesperadamente, uma fatia do bolo.
                        Ao ver o plano de governo, transcrito num panfleto, jogado na “feira de domingo”, percebi uma qualidade pífia. Entristeço-me em ver que uma candidata de tamanha envergadura, esteja rodeada de pessoas incapazes e, o que é pior, desesperadas em atenderem interesses próprios e, ainda, de uma visão administrativa, que não vai além de seus umbigos. “Mas o povo?”, eu pergunto. Ora o povo! Ele é apenas uma moeda de barganha. Nada mais.
                        Não sei se a pessoa que está na redoma de vidro, tem a noção exata do que isso representa para si e para aqueles que verdadeiramente a admiram, não para os que a bajulam. Não creio que ela prefira mais o cheiro de cavalo a cheiro do povo, como disse um ex-presidente militar. Para quem deseja representar realmente o povo, deve, antes de tudo, estar no meio dele, a fim de sentir seus sonhos e as suas lamúrias. Os mosqueteiros, nada entendem de poder e muito menos de povo.
                        Este episódio faz-me lembrar da obra “A Revolução dos Bichos”, de Eric Arthur Blair, conhecido como George Orwell. Nela Bola de Neve, o porco, é eleito presidente, com o objetivo de expulsar os humanos da fazenda e defender os interesses dos animais. Logo após eleito, é traído pelo porco Napoleão. Ao final da história, Napoleão assenhoreado do poder, passou a explorar e a torturar os animais, assim como agia Jones, o humano, quando comandava a fazenda “Granja do Solar”. Lembro-me que, quando do inicio da campanha, o porco era endeusado por aqueles que, assim como ele, sonhavam com as benesses do poder.
                        Assim como na ficção, tenho medo de que a pessoa endeusada, por conta da mente maquiavélica de seus mosqueteiros, possa enveredar pelos caminhos da embriaguez pelo poder. E ao final da história, assim como na “Granja do Solar”, o povo poderá sofrer todas as consequências daquilo que, à principio, pensava ser bom, em razão do poder de convencimento dos mosqueteiros.
                        Debruçado na janela do tempo e observando o sol da esperança que se avizinha, sonho com a quebra da redoma de vidro. E que a pessoa, antes endeusada pelos mosqueteiros e demais asseclas, possa se transformar em povo. Ao se lançar aos braços do povo, de onde emana o verdadeiro poder, encontrará a proteção sincera para governar. Diz a Constituição Brasileira: “Todo poder emana do povo e, em seu nome, será exercido”. Portanto, salvo melhor juízo, o poder não emana de bajuladores ou de espertalhões.
(*) Novo Dicionário da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira

Peruibe SP, 27 de agosto de 2012

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