Adão de Souza
Ribeiro
“Seo”
Fujiro Nacombe, era um japonês de invejável sabedoria milenar. Ele morava defronte minha
casa, lá na sagrada Terrinha. De idade já avançada, tinha uma peculiaridade no
jeito de andar, como quem não tem pressa de chegar. A maneira de falar mansa e pausada, cativava a todos seus
interlocutores e ouvintes. Eu, por exemplo, adorava estar a seu lado e ouvir
suas histórias. Penso que foi com “seo” Fujiro Kacombe, que peguei gosto pelos
causos.
O nosso personagem, era patrimônio vivo do
lugarejo. As crianças da minha infância, como todas do mundo, brincavam e
corriam o tempo todo, com suas traquinagens. Mas quando ele surgia na calçada,
defronte sua casa, todas elas se juntavam ao redor. Podia-se ver nos olhos do
nipônico, o prazer de conversar com os infantes.
Ele atendia todas as curiosidades dos
pequeninos. Gostava de contar histórias do povo do Sol Nascente. As
aventuras dos samurais, as vestimentas e as danças típicas, encantavam as crianças. As Gueixas tinham uma beleza estonteante. Também explicava como a
Terrinha, fora desbravada pelos seus ancestrais, isso no início do século.
Ele era filho legítimo do Japão, pois aqui
chegou em 18 de junho de 1908, no navio Kasato-Maru, numa viagem de 45 dias, desembarcando
em Santos SP. Veio com 793 passageiros, oriundos de Kobe – Japão. Esta é a
razão pela qual a Terrinha tinha uma grande quantidade de japoneses e seus
descendentes (nissei, sansei e yonsei).
Para agradar as crianças da Terrinha o “seo”
Fujiro Nacombe gostava de oferecer guloseimas, tais como, Taiyaki, Wagashi,
Dorayaki, Dayfuku, Manju, Warabi Mochi, Sanshoku Dango e Crepe Japonês. Eu, particularmente, gostava de suhi, sashimi e mani japonês. Olha
que a molecada foi, aos poucos, se adaptando com o gosto daquelas guloseimas. O
anfitrião nipônico, caprichava na confecção de tudo aquilo.
O que causava grande admiração, eram os
ensinamentos e conselhos que ele dava para molecada. Pode-se dizer que foi com
ele, que aprendemos a respeitar os idosos e amar a natureza. Lá no Sol
Nascente, a velhice é sinônimo de sabedoria e experiência. Cuidar da
natureza e defender o planeta, representava a sobrevivência da raça humana.
Cansei de ver os japoneses, de madrugada, trabalhando na lavoura. Eles são apaixonados
pela terra e pela lavoura.
O “seo” Fujiro Nacombe tinha umas nisseis
(filhas) lindas demais. Quando se vestiam com kimono, era de fazer o padre
interromper a santa homilia, na igreja matriz. A filha Sayuri, casou-se com
Anderson, meu amigo de infância. Precisa ver os rebentos, uns mestiços lindos,
nascidos daquele casal! A Terrinha tinha orgulho dos yonseis (netos) do “seo” Fujiro Nacombe.
As lindas festas da Independência do Brasil,
realizadas no campo de futebol, tinham o toque das mãos dos japoneses. Ao término do desfile, a população dirigia-se para aquele local. Nunca vi
um povo tão patriota, como eles. Naquele dia festivo, patrocinavam barracas de quitutes tradicionais de diversos países, danças
típicas, competições engraçadas, prêmios para molecada e por aí se vai. O evento transcorria até o pôr do sol. Nem é preciso dizer, que o “seo” Fujiro Nacombe, nosso ilustre personagem, era um dos líderes
daquela inesquecível festança.
Até hoje, trago a doce lembrança daquele
saudoso ancião oriental, sentado na calçada da Rua Rui Barbosa a nos presentear com seus
causos e vários pratos de guloseimas do país asiático. Ainda continua viva na
memória, a eterna lembrança do jeito de andar e da voz mansa a nos dar conselhos sobre
a vida e a nos ensinar a respeitar os idosos e a natureza. A hospitalidade sempre foi a marca registrada dos filhos do Sol Nascente.
Ao “seo” Fujiro Nacombe, digo: “Shin`ainaru
yujin, Sayonara, mata aimasho.” (Querido amigo, adeus e até logo).
Peruíbe SP, 28 de
abril de 2024.